O giro para a “Frente Popular” veio perto do fim de 1933 quando a Internacional Comunista, sob o domínio stalinista, faz um repentino recuo das suas políticas ultra-esquerdistas do “Terceiro Período”. Com o triunfo de Hitler e a renovada ameaça de ataque imperialista, a burocracia soviética, em pânico, definiu que precisava de aliados para a defesa da pátria soviética. A Rússia entrou na Liga das Nações e assinou o pacto de assistência militar Franco-Soviético. Ao longo desse período, a Comintern buscou se agraciar com as burguesias das potências imperialistas democráticas, através de uma contenção calculada dos movimentos proletários revolucionários na Europa. O método: alianças de colaboração de casses com a participação nos governos da burguesia. O disfarce: a luta contra o fascismo.
A Escola Stalinista de Falsificação Revisitada (4)
A frente popular encontrou expressão teórica no relatório de Georgi Dimitrov ao Sétimo Congresso da Internacional Comunista, em agosto de 1935. De acordo com Dimitrov, o principal perigo ameaçando os trabalhadores era o fascismo. Mas o fascismo ameaçava não apenas a classe trabalhadora, mas também o campesinato, a pequeno-burguesia em geral e mesmo seções da burguesa. Em consequência, a luta pela ditadura do proletariado e o socialismo seriam removidas da agenda durante esse período:
“Agora as massas trabalhadoras em uma série de países capitalistas se veem diante da necessidade de fazer uma escolha definitiva, e de fazê-la hoje, não entre a ditadura do proletariado e a democracia burguesa, mas entre a democracia burguesa e o fascismo.”
Para defender a democracia burguesa, o proletariado deveria, portanto, buscar se aliar com todos aqueles grupos sociais ameaçados pelo fascismo, incluindo as seções “antifascistas” da burguesia, em uma ampla “Frente Popular”.
“Sob certas condições, nós podemos e devemos virar nossos esforços para a tarefa de lançar esses partidos e organizações ou certas seções delas ao lado da frente popular antifascista, apesar da sua liderança burguesa. Essa, por sinal, é a situação hoje na França com o Partido Radical…”
― G. Dimitrov, “Relatório ao Sétimo Congresso da Comintern”, 1935
Durante o Terceiro Período, os comunistas haviam se recusado a emblocar com os socialdemocratas alemães em uma frente única contra Hitler, chamando-os de “social-fascistas”. Agora, os comunistas estavam não apenas dispostos a fazer alianças de longa duração com a socialdemocracia, mas a formar um governo com os setores antifascistas da própria burguesia! Posteriormente, na Itália, no fim dos anos 1930, essa “ampla aliança” ainda foi ampliada pra incluir apelos aos fascistas “honestos”!
A frente popular nada mais é do que uma expressão das teorias e práticas da colaboração de classes – um bloco de organizações e partidos representando várias classes na base de um programa comum, a defesa da democracia burguesa. Embora o nome fosse novo, o conteúdo não era. Os socialdemocratas alemães formaram governos de coalizão do “bloco de esquerda” com a burguesia democrática (representadas pelo Partido de Centro) ao longo da década de 1920. A única diferença era que os stalinistas ocasionalmente tinham a pretensão de se considerar revolucionários, enquanto os socialdemocratas foram mais abertos sobre o seu reformismo.
Os stalinistas tentam reivindicar que a frente popular é simplesmente a extensão lógica da frente única em um nível mais alto. Nada poderia ser mais distante da verdade. A “frente única proletária” era formada sob a bandeira da “casse contra classe”, e era formada precisamente com o objetivo de romper os socialdemocratas das suas perenes alianças de colaboração de classes com a burguesia “democrática”:
“A tática da Frente Única é o chamado para a luta unificada dos comunistas e de todos os outros trabalhadores, sejam ele pertencentes a outros partidos e grupos, ou pertencendo a nenhum partido, para a defesa dos interesses elementares e vitais da classe trabalhadora contra a burguesia.”
― Comitê Executivo da Internacional Comunista, “Teses sobre a Frente Única”, 1922
A frente única servia ao mesmo tempo para unir as forças de várias organizações proletárias na ação e para expor os reformistas que participariam nas lutas pelos interesses da classe trabalhadora apenas quando forçados a fazê-lo por pressão de sua base, e que também iria desertar da luta na primeira oportunidade. Já que apenas o partido bolchevique representava os verdadeiros interesses históricos da classe trabalhadora, era crucial que não houvesse programa comum com os reformistas, já que isso só poderia significar abandonar o programa leninista. Nem poderia haver nenhuma restrição ao direito de criticar outros partidos na frente única. Assim, a segunda palavra de ordem na frente única é “unidade de ação, liberdade de crítica” ou, como dizia Trotsky, “bater juntos, marchar separados”.
Na frente popular, entretanto, os partidos proletários renunciam à sua independência de classe e desistem do seu programa classista. Earl Browder resumiu isso sucintamente em seu relatório ao Comitê Central do PC/EUA em 4 de dezembro de 1936:
“Nós podemos organizá-los e levantá-los [a maioria do “povo”] desde que nós não façamos a exigência de que eles concordem com o nosso programa socialista, mas devemos nos unir com eles na base do seu programa, o qual nós também devemos fazer nosso [!].”
A frente popular comvergia com a teoria menchevique da “revolução em etapas”. Primeiro a luta pela democracia burguesa, depois a luta pela derrubada do capitalismo. Os stalinistas procederam a partir da concepção absolutamente falsa de que um conflito social básico existia entre a democracia burguesa e o fascismo. O fascismo apareceu na Europa depois da Primeira Guerra Mundial, como um desenvolvimento necessário do poder burguês em uma época de severo declínio econômico. É um último recurso dos capitalistas para preservar o seu sistema, quando já não é mais possível fazê-lo através de medidas parlamentares normais. Os stalinistas, em certo momento, tentaram até mesmo justificar o seu esquema etapista afirmando que, na verdade, o fascismo tinha suas raízes no feudalismo, e não no capitalismo!
Na verdade, a frente popular era simplesmente outra forma de solução burguesa para as condições que levaram ao fascismo. Os comunistas ou os socialdemocratas são convidados a participar em um governo capitalista em condições nas quais nenhuma combinação parlamentar burguesa pode efetivamente dominar um movimento de massas proletárias e camponesas inquietas. O preço da coalizão é o apoio dos comunistas à repressão das greves e medidas similares realizadas pelo governo no qual eles participam.
Durante os anos 1930, os governos de frente popular foram formados durante períodos pré-revolucionários na França e na Espanha. Lá, a coalizão com a burguesia “democrática” foi capaz de desarticular poderosos levantes de massa desviando as greves gerais e mesmo insurreições para o beco sem saída da defesa da democracia burguesa. Nos países coloniais, tais como o Vietnã, as políticas de frente popular levaram a abandonar a demanda pela independência! Contra a colaboração de classe dos stalinistas, os trotskistas defenderam a frente única proletária para esmagar os fascistas. Ao invés de depender dos generais republicanos e da polícia, eles chamaram pela formação de milícias de trabalhadores baseadas nos sindicatos. Pequenos em número e sujeitos a terríveis campanhas de calúnias por parte da Comintern, os trotskistas foram incapazes de ganhar suficiente influência para romper com o estrangulamento reformista do movimento dos trabalhadores. Mais uma vez as posições dos bolcheviques-leninistas se mostraram corretas, mas de uma forma negativa, pela derrota ignominiosa de promissoras situações revolucionárias. Stalin certamente merecia o apelido que Trotsky havia lhe dado – o grande organizador de derrotas.
França 1934-1936
Na França a agitação fascista fez mais progresso do que em qualquer outra das “grandes democracias”. As ligas fascistas apareceram em uma imitação evidente das organizações fascistas alemãs e italianas. Depois de anos ignorando ou minimizando o perigo fascista, os líderes dos partidos Comunista (PCF) e Socialista (SFIO) entraram em pânico depois do ataque ao parlamento realizado pelo bando armado da Croix de Feu(Cruz de Ferro), em fevereiro de 1934. Sob tremenda pressão da sua base, as federações sindicais lideradas pelos socialistas e comunistas realizaram um massivo protesto conjunto em 12 de fevereiro, cujo tamanho efetivamente serviu para fazer recuarem os fascistas por meses. A luta de Trotsky nos quatro anos anteriores por uma frente única proletária contra o fascismo era reivindicada contra as idiotices sectárias e derrotistas do terceiro período.
Em junho de 1934, o líder do PCF Maurice Thorez propôs uma frente única com a SFIO. A frente única não adotou o slogan leninista de “bater juntos, marchar separados”, mas ao invés disso tomou a forma de um “pacto de não-agressão”. Ambos partidos renunciaram à sua independência programática e deixaram de criticar um ao outro. Trotsky criticou essa frente por limitar as suas ações a manobras parlamentares e alianças eleitorais, e por se recusar a agitar os trabalhadores para uma luta extraparlamentar contra o fascismo, uma luta que poderia ter aberto a perspectiva para uma revolução proletária.
Em meio a uma aguda crise social, ondas de greves de massa e disposição de luta dos trabalhadores, o PCF se recusou a lutar pelo poder sob o argumento de que a situação “não era revolucionária”. Ao invés disso, o PCF veio à tona com um programa de “exigências econômicas imediatas”, que servia para desorientar e desorganizar o proletariado e acelerar o crescimento do fascismo, já que os capitalistas sentiam uma ameaça crescente da classe trabalhadora. O PCF renunciou à luta pelas nacionalizações, se opôs ao chamado por milícias de trabalhadores por considera-la provocativa e se recusou a armar os trabalhadores, enquanto tentava preservar uma aparência de revolucionário, chamando absurdamente por “sovietes em toda a parte”, a precondição imediata para uma insurreição armada.
Em julho de 1935, os stalinistas franceses expandiram a coalizão para incluir os Radicais Socialistas, um partido burguês. Os Radicais Socialistas, baseados na pequeno-burguesia rural e urbana, reivindicavam mudanças sociais progressivas, mas eram firmemente comprometidos com a propriedade privada e com a livre empresa. Para poder salvar sua unidade com os Radicais, o PCF insistiu que o programa da frente popular deveria se restringir à defesa da república contra o fascismo, medidas contra a depressão e reformas trabalhistas. A frente popular venceu largamente as eleições de março de 1936. A SFIO se tornou o partido dominante na Câmara dos Deputados e o seu chefe, Leon Blum, se tornou primeiro ministro de um gabinete de coalizão de socialistas e Radicais. Os comunistas se recusaram a entrar no governo para evitar assustar a burguesia, mas deu apoio no parlamento.
Como ocorre frequentemente no começo de um governo de frente popular, as massas viram as eleições como uma vitória para os trabalhadores e desencadearam uma tremenda onda militante, culminando com a greve geral de maio-junho. Enquanto as demandas iniciais eram principalmente defensivas, centrando em um aumento salarial de 15%, as greves envolviam, quase todas, a tática militante de ocupar os locais de trabalho. A burguesia entrou em pânico, exigindo que o governo de Blum fosse empossado imediatamente para conter a greve. Blum e os burocratas sindicais da CGT negociaram um acordo inicial que oferecia alguns ganhos, mas sob condições de evacuação imediata das fábricas. O pacto foi solidamente rejeitado pelos metalúrgicos de Paris.
Temendo que Trotsky tivesse razão quando escreveu que “começou a revolução francesa”, o PCF ordenou seus militantes a apoiar os acordos. Thorez declarou: “Não pode haver o menor questionamento a respeito de tomar o poder nesse momento” e “deve-se saber quando terminar uma greve”. O governo Socialista-Radical fez sua parte proibindo a circulação do jornal trotskista (Lutte Ouvrière), que chamava pela continuação da greve. Em meados de junho, os esforços combinados dos reformistas foram bem sucedidos em minar a resistência.
Esse foi o ponto alto da frente popular, já que foi desarticulando a greve geral de 1936 que o governo Blum cumpriu a tarefa básica que lhe foi dada pela burguesia – parar a avalanche rumo à revolução. As poucas reformas sociais significativas, tais como a semana de 40 horas, foram logo revertidas. Em 1937, depois de um ano no cargo e tendo perdido a confiança das massas trabalhadoras, o governo Blum foi destituído pelo Senado. Em meados de 1938, os Radicais Socialistas formaram um ministério conservador sob Edouard Daladier. O anúncio de Daladier naquela primavera, sobre o retorno à semana de 48 horas, provocou uma nova onda de greves de massa. A resposta do PCF: o chamado por uma greve de protesto de um dia! Daladier declarou a lei marcial e mandou tropas às fábricas. O movimento sindical entrou em colapso, milhões de trabalhadores rasgaram seus registros sindicais em repúdio. Por volta de janeiro de 1940, os partidos burgueses, assim como os delegados da SFIO, votaram pela criação do regime de Vichy, de aceitação e colaboração com os fascistas. Assim, longe de parar o fascismo, a frente popular provou ser apenas mais um “caminho pacífico” para o barbarismo.
A frente popular na Espanha, 1936-1939
As consequências da política de frente popular de Stalin-Dimitrov foram igualmente contrarrevolucionárias na Espanha. A derrubada da monarquia em 1931 tinha levado ao estabelecimento de uma república burguesa, mas as políticas sociais da coalizão Radical/Socialista no governo eram pouco mais liberais do que aquelas da ditadura militar do Gen. Primo de Rivera durante os anos 1920 (também apoiada pelos socialdemocratas). Em outubro de 1934 uma insurreição irrompeu na região mineira das Astúrias em reação às políticas direitistas do governo. Apesar da repressão sangrenta (milhares de mineiros foram metralhados pelo exército), o levante heroico despertou as massas trabalhadoras espanholas e levou à formação difundida de comitês proletários em forma de frente única (alianzas obreras).
Em resposta, os líderes dos principais partidos de trabalhadores agiram para montar uma frente popular similar àquela da França, incluindo os Socialistas (alas direita e esquerda), os Comunistas e também o POUM (Partido Operário da Unificação Marxista). O POUM havia sido formado pela fusão de um racha de direita do PC (o “Bloco Operário e Camponês” de Maurín, que Trotsky havia descrito como um “Kuomintang espanhol”, ou seja, um partido de duas classes) e a antiga Esquerda Comunista, dirigida por Nin. Como resultado da formação desse bloco sem princípios com Maurín, e a assinatura do programa da Frente Popular, as ligação entre Nin e o movimento trotskista foram rompidas.
O acordo da Frente Popular assinado em janeiro de 1936 foi um documento clássico de abandono de políticas proletárias classistas. Ele garantia que:
“Os republicanos não aceitam o princípio da nacionalização da terra e da sua livre entrega aos camponeses (…). Os partidos republicanos não aceitam medidas de nacionalização dos bancos… e de controle operário reivindicado pela delegação do Partido Socialista.”
A aliança republicano-proletária ganhou uma pluralidade nas eleições de fevereiro de 1936 e, entretanto, formou um governo sob controle do advogado burguês Azaña. Como na França, as massas interpretaram isso como uma vitória e começaram uma onda de ocupações de fábrica e ocupações de terra, que o governo foi incapaz de conter. Em consequência, em 17 de julho, o general Franco e um grupo de altos oficiais militares lançaram uma proclamação por um Estado católico autoritário e realizaram uma rebelião. A resposta do governo de Azaña foi tentar negociar com os generais insurgentes, enquanto se recusava a armar as massas!
Essa tentativa de contemporizar poderia até ter tido sucesso se as massas não tivessem tomado a própria iniciativa. Em Barcelona, um reduto dos anarquistas e do POUM, os trabalhadores tomaram numerosas fábricas e assaltaram o quartel do exército com pistolas. Em menos de um dia eles tinham o completo controle da cidade. Isso deu o sinal para revoltas similares por toda a parte, e o governo republicano foi forçado a rever a sua política, armar as massas e tentar uma luta hesitante contra Franco.
A alternativa era uma revolução proletária, que era possível a qualquer momento. Na Catalunha, o transporte e a indústria estavam quase inteiramente nas mãos dos comitês de trabalhadores da CNT (Anarquista), enquanto em grande parte do Nordeste (Catalunha e Aragão) as associações de camponeses e trabalhadores agrícolas tinham estabelecido fazendas coletivas. Os antigos governos municipais desapareceram, substituídos por comitês que representavam a todos os partidos e sindicatos antifascistas. O mais importante era o Comitê Central das Milícias Antifascistas da Catalunha que, apesar de terem membros burgueses, era amplamente dominada pelas organizações dos trabalhadores. No entanto, no topo de tudo isso estava a “sombra da burguesia”, um governo de frente popular na Catalunha, dirigido por outro advogado burguês, Companys. Como na Rússia de fevereiro a outubro de 1917, havia uma situação de duplo poder, mas na qual os trabalhadores ainda davam apoio tácito ao abalado governo burguês.
Nessa situação, Lenin e os bolcheviques haviam exigido: “Abaixo o Governo Provisório, Todo Poder aos Sovietes!”. Os partidos proletários espanhóis, entretanto, dos stalinistas ao POUM e mesmo os anarquistas (que supostamente se oporiam mesmo a um governo proletário!) entraram no governo burguês da Catalunha, em setembro de 1936. OS stalinistas garantiram aos seus amigos burgueses que eles não tinham nenhuma intenção de levar os trabalhadores ao poder. Em agosto de 1936, o jornal do PC francês, L’Humanité, declarou que:
“O Comitê Central do Partido Comunista da Espanha nos pede que informe ao público… que o povo espanhol não está lutando pelo estabelecimento da ditadura do proletariado, mas que ele conhece apenas um objetivo: a defesa da ordem republicana, respeitando a propriedade privada.”
Com apoios garantido dos stalinistas e socialistas, Azaña e Companys começaram a se mover para restabelecer a lei e a ordem burguesas. O primeiro passo foi a censura da imprensa proletária. O governo catalão fez isso com um decreto dissolvendo os comitês revolucionários, que haviam surgido em julho, e, no fim de outubro, ele ordenou o desarmamento dos trabalhadores na retaguarda. Os líderes do POUM e da CNT foram em seguida expulsos do gabinete, apesar de eles terem apoiado todas essas medidas contra os trabalhadores. Uma polícia secreta foi organizada sob o controle dos stalinistas e de agentes da GPU soviética.
Mas isso não foi o suficiente para quebrar a resistência dos trabalhadores. Uma provocação era necessária. Isso veio em 3 de maio de 1937, quando os stalinistas atacaram a central telefônica de Barcelona, controlada pelos trabalhadores da CNT. Dentro de horas foram erguidas barricadas pela cidade e os trabalhadores mais uma vez estavam em posição de tomar o poder. Ao invés disso, os líderes do POUM e dos anarquistas capitularam ao governo central, confiando na promessa de Azaña de que não haveria represálias. Dois dias depois, os Guardas de Assalto chegaram e ocuparam a central, matando centenas e prendendo dezenas de milhares. Dentro de um mês, o POUM estava na ilegalidade a pedido dos stalinistas, e seus líderes acabaram presos ou mesmo assassinados. Em pouco tempo, o PC comandou os Guardas de Assalto na dissolução das fazendas coletivas e milícias proletárias. Embora a guerra tenha se arrastado por mais um ano e meio, o resultado já estava decidido – uma vez que os trabalhadores e camponeses não tinham mais nada pelo que lutar, eles rapidamente se desmoralizaram e os armamentos superiores dos fascistas lhes garantiram a vitória.
Em tudo isso o PC espanhol agiu como o defensor da ordem burguesa, liderando a ofensiva contra os anarquistas e o POUM, as fazendas coletivas e as milícias proletárias. Em seu desesperado desejo de chegar a uma aliança com as potências imperialistas “democráticas”, Stalin estava absolutamente contrário à revolução na Espanha – mesmo que isso significasse que a vitória dos fascistas era a alternativa. O grande organizador de derrotas também se tornava o açougueiro da revolução espanhola.
Mas a responsabilidade pelo desastre não acaba aí. Nin e os outros líderes da Esquerda Comunista um dia haviam lutado pela independência de classe do proletariado. Em certa época eles tinham sido um partido maior do que o próprio PC. Mas, ao capitular à frente popular, esses centristas foram tão responsáveis pela derrota da revolução espanhola quanto Stalin. Tivessem eles sabido nadar contra a corrente nos momentos em que a frente popular tinha apoio de massas e eles poderiam ter ganhado a liderança do movimento dos trabalhadores quando as massas posteriormente perceberam que elas haviam sido traídas. Na realidade, o POUM seguiu junto com as traições, protestando apenas quando era tarde demais.
A frente popular na Segunda Guerra Mundial
É digno de nota que o ataque de Davidson ao trotskismo, junto a completamente ignorar a revolução russa de outubro de 1917 e a política ignominiosa de Stalin na Alemanha, também não menciona as políticas de Stalin na França e na Espanha em nenhum momento. E por um bom motivo! Mas, como bom stalinista, ele precisa defender a frente popular de alguma forma, preferencialmente com um exemplo mais aceitável. Ele escolheu a Segunda Guerra Mundial. De acordo com os stalinistas, essa foi uma guerra contra o fascismo e em defesa da pátria soviética. A sua conclusão política foi uma frente popular ampla, “incluindo mesmo os aliados temporários e oscilantes que se encontravam no campo dos governos capitalistas democrático-burgueses” (Guardian, 9 de maio de 1973).
Davidson faz um resumo preciso da posição trotskista na guerra, concluindo que ninguém além dos “trotskistas contrarrevolucionários” teria se oposto à grande cruzada antifascista. Mas, enquanto a política stalinista era certamente mais popular na época, ela não será facilmente esquecida pela nova geração de trabalhadores combativos, que tem bem menos ilusões sobre o caráter “democrático” do imperialismo dos EUA. A posição trotskista na guerra era de derrotismo revolucionário para os países capitalistas nessa guerra inter-imperialista. Ao mesmo tempo, eles davam apoio incondicional à defesa militar da União Soviética. Isso não era uma mera questão acadêmica, já que Trotsky lutou uma dura batalha contra o grupo de Shachtman (dentro do então trotskista Partido dos Trabalhadores Socialistas [SWP/EUA]). Shachtman se opunha a defender a URSS e acabou saindo do SWP, levando com ele 40% dos membros.
Durante a guerra, os quadros trotskistas numericamente frágeis conduziram em geral uma linha internacionalista, apesar de pressões social-patriotas em algumas seções. A seção francesa, por exemplo, organizou uma célula trotskista na marinha alemã, que ocupava o país. No processo, entretanto, muitos líderes da Quarta Internacional foram executados ou pelos nazistas ou, como Nin na Espanha, pelas mãos dos stalinistas. Nos EUA, o SWP concentrou o seu trabalho em combater o acordo de não fazer greves apoiado pela liderança da central sindical CIO e o PC.
Os stalinistas tinham a política inversa. De acordo com o líder do PC/EUA, Earl Browder:
“Nos Estados Unidos, nós temos que ganhar a guerra sob o sistema capitalista… Portanto, nós temos que descobrir como fazer o sistema capitalista funcionar… Nós temos que ajudar os capitalistas a aprender como gerir o seu sistema.”
O Daily Worker (o jornal do PC/EUA) de 25 de dezembro de 1941 implementou essa política saudando o compromisso da CIO de não fazer greves como uma “contribuição definitiva à unidade nacional”. Na prática, isso significava impedir greves. Durante a greve dos mineiros em 1943, o líder sindical do PC, William Z. Foster, viajou para os distritos mineiros da Pensilvânia para tentar organizar fura-greves e um movimento “De Volta ao Trabalho”. Na costa Oeste, Bridges, um simpatizante do PC no ILWU (Sindicato dos Portuários e Estivadores) chamou pela intensificação do trabalho.
Assim, nos anos 1930 e 1940, a política de frente popular levou a um resultado prático idêntico: derrotar greves e revoluções. A estrangulação da revolução espanhola, a derrota da greve geral francesa, furar a greve dos mineiros nos Estados Unidos – esses foram os resultados da colaboração de classes. Tirando a conclusão lógica, Stalin fez outra concessão aos seus amigos burgueses ao dissolver a Internacional Comunista em 1943, porque ela entravava o esforço conjunto para vencer a guerra!