Garota de 17 anos morre de aborto
Onde estão os verdadeiros culpados?
Por Judy Mage
[Originalmente impresso em The Young Socialist, Vol. 1 #5, publicação da juventude de Nova Iorque do Socialist Workers Party (SWP) norte-americano, de fevereiro de 1958. Tradução realizada pelo Reagrupamento Revolucionário em março de 2013].
“Garota de 17 anos encontrada morta: vítima de um aborto mal feito”. Assim estava escrito nas manchetes dos jornais de Nova Iorque em uma noite fria de dezembro passado. Lendo mais, descobrimos mais uma cruel e típica história: uma gravidez indesejada, o namorado ajudante, o “cirurgião”, nesse caso de uma recepcionista, a operação no chão de um quarto de hotel, a moça morta dentro de meia-hora, um enterro secreto em uma sepultura cheia de lixo; e depois, a descoberta, e as acusações de homicídio não premeditado.
Sim outra tragédia, outra vítima – de que? De um “aborto mal feito” de uma recepcionista operada em um chão sujo com instrumentos rústicos? Ou então outra vítima de uma lei que ilegaliza essa operação, transformando o que poderia ser uma cirurgia pequena e relativamente segura, se realizada em condições completamente antissépticas por um especialista treinado, em algo perigoso, muitas vezes danoso e algumas vezes fatal.
QUANTAS VÍTIMAS?
Quão perigoso? Especialistas estimam que de 100 a 150 mulheres e meninas morrem a cada semana nos Estados Unidos como resultado direto de “abortos criminosos”. Estimativas do número total de abortos ilegais que ocorrem nesse país cada ano variam de aproximações conservadoras de 330 mil – cerca de mil por dia – até mais de dois milhões.
São as mulheres e meninas mais pobres, é claro, as principais vítimas do aborto de “açougue”, também conhecido medicamente como “aborto suicida”. Aqueles com mais dinheiro para gastar conseguem mais facilmente um médico “de verdade” que pode incrementar sua renda consideravelmente em troca de correr um pequeno risco. Os preços atuais, de acordo com um estudo feito há dois anos, variam de $250, uma média baixa entre os médicos, até $400, $600 e até mais que $1000.
Particularmente chocante para qualquer um que faça alguma pesquisa sobre esse assunto, é descobrir que entre oitenta e noventa por cento dos abortos ilegais são realizados não em adolescentes selvagens, “delinquentes” (ou mesmo em adolescentes gentis e ingênuas, como a de 17 anos descrita acima), mas em mulheres casadas, a maioria das quais já são mães. Além disso, alguns pesquisadores estimam que metade dos abortos ilegais são realizados em mulheres que nem mesmo estão grávidas.
Qual é a solução? Em alguns países, avançou-se ao ponto de permitir abortos por outros motivos que não “terapêuticos”. Na Dinamarca, Áustria, Cuba, Suíça e na União Soviética (depois de um retrocesso de 20 anos), Suécia, Japão e alguns outros países, motivos legais incluem fatores econômicos, psiquiátricos, eugênicos e outros de ordem social.
Nos Estados Unidos, oponentes de qualquer “relaxamento” nas leis de aborto levantam uma série de argumentos, mas há dois que predominam dentre os outros. O primeiro é mantido em particular pela Igreja Católica, que diz que já que o embrião é uma “pessoa com vida”, seria um pecado tirar sua vida. Pode-se contestar a consistência de uma organização que permaneceu calada quando embriões sem batismo foram destruídos em grandes quantidades em Hiroshima e Nagasaki; e que justificou e continua justificando o assassinato, em grandes e pequenas guerras, de centenas de milhares de “pessoas com vida” que inconvenientemente estão fora do útero.
GUARDIÕES DA MORAL
O outro argumento, também levantado pela Igreja, mas por muitos outros também, diz respeito à torrente de promiscuidade, especialmente entre a juventude, em que presumivelmente se resultaria caso o medo de uma gravidez deixasse de existir como obstáculo. Mas com que direito essas pessoas se declaram árbitros do que é certo e errado? Quem os elegeu? Por que não deixar os jovens decidirem por si mesmos quais seus padrões de moralidade devem ser, ao invés de impor o padrão de alguém sobre eles?
É verdade que a legalização do aborto não é a resposta completa. Ainda mais importante é o encorajamento de uma forma de “medicina preventiva”, ou seja, controle de natalidade. Embora a disseminação de informação sobre controle de natalidade não seja ilegal na maior parte dos Estados Unidos, a maior agência nesse campo, a secretaria de Planejamento Familiar, encontra grandes barreiras organizadas, novamente, pela Igreja Católica. Embora exista outro importante fator atrapalhando o sucesso de um controle da natalidade difundido e acessível, que é a ausência que um contraceptivo realmente simples, barato e acessível.
As pesquisas ainda continuam naquilo que é popularmente chamado de “pílula”, uma substância aplicada oralmente que seria ao mesmo tempo segura e confiável em prevenir a concepção. A secretaria de Planejamento Familiar mantém um programa de pesquisa, mas os recursos aplicados nisso são extremamente pequenos. Como uma mulher envolvida nessa pesquisa colocou: “Nós poderíamos ter a resposta dentro de dez anos. O que é preciso é um Projeto Manhattan – um programa intensivo!”.
Mas não há programa intensivo – e na ausência da adequada informação e orientação sobre controle da natalidade, na ausência de leis de aborto humanas e realistas, garotas de 17 anos e mães de 35 anos vão continuar a morrer como vítimas de facões desajeitados.