“O caminho é a luta e não as eleições”: novo giro do PSTU
Por Pablo Pedrosa, abril de 2017
Ziguezagues entre uma linha reformista e uma com aparências de revolucionária são a marca maior de organizações centristas. Depois de passar mais de um ano bradando por “Eleições Gerais para por para fora todos os corruptos”, o PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados) parece ter abandonado essa palavra de ordem, que já não aparece em seus textos principais desde os fins de 2016. Em recente editorial do jornal Opinião Socialista, o partido simplesmente se esqueceu de seu passado recente e defendeu que:
“O caminho para derrotar as reformas de Temer e do Congresso é a luta e não as eleições. A solução não é Lula 2018 como defende o PT. Não dá para esperar. A hora de lutar para vencer é agora. O que os trabalhadores precisam é construir a greve geral e manter sua mobilização permanente contra qualquer ataque que vier. […] A saída é que os trabalhadores governem em conselhos populares. A saída é fazer os banqueiros, as multinacionais e os corruptos pagarem a conta da crise que criaram, começando por suspender o pagamento da dívida pública que suga quase metade do orçamento do país. Um governo socialista dos trabalhadores, que precisa nacionalizar e colocar sob controle dos trabalhadores o sistema financeiro, a propriedade dos corruptos e das multinacionais. Não vamos conseguir isso com eleições, mas com a mobilização dos trabalhadores.” (ênfase nossa)
– Editorial: Vamos parar o Brasil, a saída é a luta, é a Greve Geral, 29/03/2017.
http://www.pstu.org.br/editorial-vamos-parar-o-brasil-a-saida-e-a-luta-e-a-greve-geral/
Conforme criticamos em materiais como nosso artigo A esquerda ante a crise brasileira (março de 2017 ) o PSTU até pouco tempo defendia um conjunto de reivindicações que demonstravam confusão e total desnorteamento político sobre a conjuntura e as tarefas de um partido revolucionário. Ao não reconhecer o caráter reacionário do impeachment, defendeu primeiro que se pusesse “para fora” os corruptos, fazendo do centro de sua política o “Fora Dilma, Fora Todos!”. Ao fazer isso, flertava com o pedido de impeachment contra Dilma reivindicado pelo conjunto dos partidos burgueses da direita, o Judiciário e a grande mídia. Sem deixar em nenhum momento de denunciar aos trabalhadores o caráter do então governo do PT, era necessário ter combatido o impeachment, colocando-se contra a realização do mesmo por representar uma aceleração das medidas exigidas pela burguesia contra os trabalhadores, como logo ficou demonstrado. O PSTU defendeu, ao contrário, que o impeachment era “insuficiente” (suas palavras).
Afirmava, ao mesmo tempo, que o “Fora Dilma, Fora Todos” deveria ser imposto não pelo parlamento corrupto, mas pela mobilização popular, que deveria comandar uma Greve Geral, cuja coroação deveria ser a realização de “novas eleições, com novas regras”:
“O PSTU vem afirmando a necessidade de uma greve geral para botar todos eles para fora e derrotar o ajuste fiscal. A classe trabalhadora, hoje, é capaz de fazer essa greve e garantir eleições gerais. Isso fica demonstrado quando operários paralisam fábricas com essa palavra-de-ordem, como aconteceu na GM, na Embraer e em outras fábricas de São José dos Campos (SP). Ou nas obras com milhares de operários da construção civil, como em Belém (PA).
(…) Agora, com Temer prestes a assumir a presidência em conchavo com a oposição burguesa e apresentando um claro programa de ataques aos trabalhadores, o PSTU reafirma o chamado à CUT, CTB, ao MST, a que somem forças com a CSP-Conlutas e o Espaço de Unidade de Ação na convocação de uma greve geral que pare o país, coloque todos pra fora: Dilma, mas também Temer, Cunha e esse Congresso Nacional. E exija a convocação de eleições gerais já.”
– Greve geral para botar pra fora todos eles e exigir Eleições Gerais, 18 de abril de 2016
http://www.pstu.org.br/greve-geral-para-botar-pra-fora-todos-eles-e-exigir-eleicoes-gerais-35921/
Com essa política, o partido apelava a alternativas circunscritas ao estado burguês, rebaixando o programa revolucionário ao “possibilismo”. Como não era possível o sucesso (imediato) de uma alternativa independente dos trabalhadores, afirmava o PSTU, o melhor seria fazer eleições para todos os cargos políticos. Porém, ao fazer isso, reforçava ilusões no sistema eleitoral, ao dizer que ele dava ao povo a possibilidade de “trocar todo mundo, se quiser”. Não dizia que isso em nada mudava a estrutura do país, pois a burguesia seguiria mantendo o poder por meio do seu Estado (inclusive as forças policiais) e da grande propriedade. Além do mais, a combinação das palavras de ordem do “Fora Todos!” e de “Eleições gerais!” formava uma combinação esdrúxula. O PSTU queria que todos os políticos da burguesia saíssem, para então colocar todos eles de volta por meio das eleições (o que era inevitável nos limites do Estado capitalista). Entretanto, como afirma corretamente o PSTU de agora (depois deste giro) o que é preciso é “colocar sob controle dos trabalhadores o sistema financeiro, a propriedade dos corruptos e das multinacionais” e que “Não vamos conseguir isso com eleições”.
Contraditoriamente, o partido também chamava em algumas ocasiões por um “governo de trabalhadores baseado em conselhos populares”. Mas isso ficava em segundo plano em sua agitação cotidiana. Na maior parte do tempo, através da sua política agora empurrada para debaixo do tapete, o partido apontava a mudança por meio das “eleições gerais” (ver foto). Essas vacilações são típicas do centrismo e certamente acontecerão novamente. Isso porque tal mudança de política não vem acompanhada de nenhum balanço honesto e autocrítica profunda da sua política anterior, mas sim de forma silenciosa, ignorando que por vários meses, mesmo depois do impeachment, seguiu defendendo essa pauta, que agora é considerada inútil.
No Rio de Janeiro, até tão recentemente quanto fevereiro de 2017, o PSTU afirmava que “estava na ordem do dia” realizar eleições gerais, como resposta à privatização da empresa estadual de tratamento de água (CEDAE) pelo governo do PMDB:
“Vamos seguir a luta contra o pacote mas vamos reunir trabalhadores, servidores públicos, estudantes e toda a população numa grande campanha pelo Fora Pezão, Eleições Gerais, Já.”
“O Fora Pezão, Eleições Gerais Já, entrou na ordem do dia. Pezão pode cair a partir de uma grande mobilização. É preciso ganhar as ruas com o Fora Pezão, transformar em ação o ‘abaixo o governo’. É possível derrubá-lo pelas mãos do movimento de massas e abrir outra conjuntura no estado e no país, que também coloque o Fora Temer em outro patamar.” (ênfase nossa)
– Não à privatização da CEDAE! Fora Pezão! Eleições Gerais já!, 22/02/2017.
http://www.pstu.org.br/nao-a-privatizacao-do-cedae-fora-pezao-eleicoes-gerais-ja/
Diante da ausência de qualquer explicação, podemos apenas especular as razões dessa mudança. Não houve alteração significativa de conjuntura que o PSTU pudesse apontar para justificá-la, visto que não chegaram a ocorrer as suas “eleições gerais com novas regras” e nem uma troca do governo estabelecido após a queda de Dilma. Talvez a mudança se deva à proximidade das eleições nacionais de 2018 e o consequente início da corrida eleitoral, que faz com que o tema das eleições (escolhas de candidatos, alianças, plataformas) comece a aparecer com maior frequência na imprensa e agitação de parte da esquerda. Dessa forma, ao dizer que “o caminho é a luta e não as eleições”, o PSTU acaba figurando à esquerda de parte de seus adversários.
Outra possibilidade sobre a qual vale especular é o fato de que um dos grupos que ainda defende a perspectiva das eleições como forma de, supostamente, promover uma saída no interesse dos trabalhadores, é o MAIS (Movimento por uma Alternativa Independente e Socialista), que rompeu com o PSTU em julho de 2016. O MAIS tomou uma posição contrária ao impeachment (e consequentemente à política de “Fora Todos” do PSTU), mas também adotou uma perspectiva de aliança política, inclusive eleitoral, com setores do PSOL, o que foi largamente praticado com seu apoio aos candidatos liberal-reformistas deste partido (Luciana Genro, Luíza Erundina, Marcelo Freixo etc.), conforme criticamos anteriormente (ver Os revolucionários e as eleições burguesas, setembro de 2016). Este giro da direção do PSTU traça, sem dúvida, uma demarcação pela esquerda com seus antigos camaradas.
Independente das nossas especulações, fato é que nenhum balanço foi realizado sobre o erro da defesa do “Fora Dilma, Fora Todos” ou o porquê da defesa, por mais de um ano, da perspectiva igualmente equivocada de eleições gerais. Um balanço honesto da demanda por “eleições gerais” concluiria que ela não serve ao proletariado brasileiro na atual conjuntura política e nem servia no período anterior. A demanda por eleições livres serve fundamentalmente aos contextos em que esse direito mínimo foi retirado (por ditaduras bonapartistas ou fascistas). Mas a burguesia brasileira já realiza suas eleições, com severas restrições à expressão democrática dos partidos da classe trabalhadora (que devem ser denunciadas, é certo) e as usa para sua dominação. Outras demandas democráticas, referentes a direitos cerceados pelo atual regime, se colocam na ordem do dia – tais quais a queda dos processos contra os lutadores das causas sociais, a defesa dos direitos de greve e manifestação, contra os privilégios e abusos da casta política e do Judiciário, e o fim das polícias militares, por exemplo. Em última instância, o proletariado brasileiro precisa, não de mais rodadas da engrenagem eleitoral da “democracia” dos ricos e poderosos, mas sim do estabelecimento do seu poder como classe, para a realização dos interesses da grande maioria do povo.
Cabe ressaltar que a atual “correção” discreta e cínica de linha não indica a adoção de uma política revolucionária consistente pelo PSTU. Como exemplo das suas vacilações centristas, observamos que, no mesmo editorial, o partido deposita todas as esperanças na “Greve Geral” marcada para o dia 28 de abril, que não será mais que um novo “dia nacional de paralisação”, em que as centrais sindicais buscarão enganar os trabalhadores. Tendo participado da reunião convocatória, o PSTU não critica a data longínqua, decidida pela cúpula das burocracias sindicais de forma a dar tempo para que os golpistas aprovem seus ataques a toque de caixa. A Força Sindical e a UGT já demonstraram estarem dispostas a negociar – e aceitar! – os ataques de Temer, enquanto a CUT e a CTB farão de tudo para transformar a data num grande palanque para Lula.
O PSTU diz que “as centrais sindicais precisam ir até o fim na luta. Não podem vacilar nem podem negociar nossos direitos e aceitar ou propor emendas na reforma da Previdência nem na trabalhista”. Isso é uma ilusão. O que é preciso dizer é que essas centrais vão tentar trair a luta em nome dos seus próprios interesses políticos de conciliação com o Estado capitalista (cada uma em sua variante). A participação no dia de luta das centrais não pode ser a seu reboque, e sim fazendo a sua denúncia. A unidade de ação sindical ou em greve (onde for convocada pelas grandes centrais) não deve obscurecer o principal objetivo político: preparar os trabalhadores para passarem por cima das burocracias para defender efetivamente os seus interesses.
A tarefa do momento não é o pacto com as cúpulas burocráticas, mas a denúncia de seus oportunismos e organizar comitês de base em nossos locais de trabalho, estudo e moradia, rumo a uma frente única de lutas para confrontar os ataques da burguesia. E, dentro dessa frente, será tarefa dos socialistas defender a perspectiva de fundo de um governo revolucionário dos trabalhadores como solução para a crise brasileira, apresentando demandas transitórias diversas que mostrem aos trabalhadores que a resolução dos nossos problemas se encontra na superação do capitalismo.