O panfleto reproduzido a seguir (Download PDF) foi distribuído pelo Reagrupamento Revolucionário na assembleia dos estudantes da UFRJ em 13 de agosto. A assembleia discutiu as perspectivas da greve estudantil e ocorreu durante a realização de um piquete com ocupação do campus do Largo São Francisco, no Centro do Rio de Janeiro.
O piquete, do qual o RR participou e ajudou a organizar junto com outras forças políticas e militantes independentes, foi organizado pelos estudantes em resposta a uma decisão de cúpula de alguns professores do campus de retornar às aulas apesar da manutenção da greve dos professores, funcionários e estudantes que já atingiu 100% dos Institutos Federais de Educação.
O panfleto buscou dialogar com os ativistas de outras correntes políticas, e aqueles que participam da greve estudantil em geral, sobre como avançar rumo a um programa capaz de confrontar diretamente o projeto educacional do governo Dilma e a estrutura social capitalista que ele sustenta.
Para além dos “10% do PIB já”…
Uma forma radical exige um conteúdo radical!
Uma forma radical exige um conteúdo radical!
A resistência estudantil e a luta pela manutenção da greve contra ambas as ameaças do governo Dilma e as tentativas de sabotagem dos fura- greves são uma demonstração de coragem e energia. Com a perspectiva de endurecimento do governo Dilma, já declarada abertamente, assim como a tentativa de setores fura-greves em retornar às aulas, uma radicalização do movimento se fará essencial para que a greve dos professores, funcionários e estudantes se mantenha viva e forte. Os trabalhadores e estudantes da UFRJ devem permanecer firmes na luta pelas suas reivindicações já aprovadas nas assembleias de base.
Nesse momento decisivo da greve, assim como nos anteriores, os estudantes certamente não poderão contar com os representantes de Dilma dentro do movimento estudantil, a direção majoritária da UNE (PCdoB e PT), cujos membros fingem servir a dois senhores, enquanto já demonstraram que estão mais preocupados em garantir a estabilidade do governo do que ir até o fim com a luta dos estudantes. Esse também é o momento de fazer uma coisa que o Comando Nacional de Greve (CNG) estudantil se mostrou incapaz de fazer até agora, desde o começo da greve: contrapor o projeto do governo Dilma para a educação com um projeto anticapitalista que atenda às verdadeiras necessidades dos trabalhadores e estudantes. O CNG é uma representação das forças políticas que tem mais influência na base nesse momento e estão dirigindo a greve, o PSOL e o PSTU. Ele se pauta por um programa que podemos caracterizar como “economicismo estudantil”, cuja demanda central é exigir que o governo Dilma invista “10% do PIB já” na educação pública.
Apesar de diferenças táticas entre PSOL e PSTU (como ocupar ou não a secretaria do MEC em Brasília) esse bloco se mantém firme na base política de centrar os objetivos da greve estudantil nessa demanda. Essa demanda pelos “10% do PIB já”, que é a base do bloco mantido entre o PSOL e o PSTU, possui limitações sérias. São elas: (1) não questiona frontalmente o projeto liberal de educação do governo, se limitando a pedir que haja mais verbas na sua aplicação; (2) não questiona o caráter extremamente EXCLUDENTE da universidade, deixando de lado a demanda histórica pelo livre acesso e fim do Vestibular/Enem; (3) não vai à raiz dos problemas no fato de a universidade estar inserida numa estrutura social capitalista de extrema desigualdade. Ou seja, não declara guerra à ilusão de que a educação pode ser completa e saudável sob um sistema social extremamente doente.
Numa sociedade onde a classe trabalhadora, à frente das outras classes oprimidas, é a única capaz de resolver essas contradições a favor de uma educação plena, a luta dos estudantes e trabalhadores da educação deve apontar para uma forma de sociedade alternativa, controlada pelos trabalhadores e rumo ao fim da desigualdade social. A estratégia dos estudantes nessa greve deve apontar esse objetivo, buscando fazer uma ponte entre as reivindicações setoriais e específicas e a necessidade de lutar pelo socialismo. Assim, as lutas e as conquistas devem se constituir não como um fim em si mesmas, mas como um meio para um objetivo maior.
O bloco do PSOL/PSTU à frente do CNG, apesar de sua declaração de oposição ao governo Dilma e de suas reivindicações do marxismo, tem claramente mantido a luta dos estudantes num beco sem saída. Enquanto o “10% do PIB já” é uma demanda apoiável, ela não entra em choque com o capitalismo. Mesmo que os 10% do PIB sejam conquistados como investimento do governo na educação pública (e nada indica que esse valor seja suficiente para dar conta da demanda de recursos da educação), não serão os estudantes e trabalhadores a decidir sobre a sua aplicação, o que implica que pode continuar havendo uma maioria de investimentos que não correspondem ao interesse dos estudantes e trabalhadores da universidade (inclusive em fundações/cursos privados). Aestrutura de poder da universidade permaneceria, assim como permaneceria inalterada a estrutura da sociedade como um todo.
É hora de os estudantes formularem em debates desde a base um programa para a educação pública de enfrentamento direto ao capitalismo. Componente essencial desse programa deverá ser a luta pelo fim do Vestibular/Enem, e assim o acesso universal à educação pública superior. Essa demanda, se agitada corretamente, ganhará a adesão de milhões de estudantes que temem não conseguir passar pelo funil social e racial da universidade, assim como os estudantes obrigados a pagar altíssimas mensalidades para os tubarões do ensino privado, os quais foram tão beneficiados por Dilma e Lula nos últimos 10 anos.
Outra demanda capaz de alavancar o movimento é a de transporte, moradia e alimentação gratuitos para os estudantes conforme a demanda. A dificuldade dos jovens em conseguir empregos, o fato de que são sempre empurrados para os trabalhos pior remunerados, faz com que muitos oriundos da classe trabalhadora tenham dificuldades ou se sacrifiquem para arcar com os custos altíssimos do ensino, mesmo aqueles da universidade pública. Essa demanda vai de encontro a isso. Para as estudantes e trabalhadoras mães, o mesmo se aplica às creches e outras necessidades das crianças: devem ser disponibilizados gratuitamente pelas universidades conforme a demanda.
Junto a isso, a privatização da educação pública deve ser combatida com o programa de expropriação sob o controledos estudantes e trabalhadores das universidades privadas (para que se tornem públicas) e de fim da terceirização do trabalho, dando imediatamenteaos terceirizados estabilidade, condições e salários iguais aos dos efetivos. Essa luta precisa, inclusive passar por cima da legislação draconiana mantida pelo governo Dilma, que conduz à contratação de trabalhadores, em maioria mulheres e negros, sob um regime precário para trabalhar na universidade.
Do ponto de vista do CNG (PSOL/PSTU) essas demandas ficam em segundo plano diante dos “10% do PIB já”. Mas os “10% do PIB” cobrados do governo Dilma de forma nenhuma garantem a aplicação dessas demandas. Em todas as manifestações públicas do CNG, os “10% do PIB já” aparecem, não como uma demanda parcial aliada a reivindicações mais avançadas, mas como uma barreira, como “substituto” de um programa de confronto aberto com o capitalismo e com o governo Dilma. As demandas que apresentamos são apenas um esboço, que deve ser debatido e enriquecido através de discussões na base do movimento, para forjar, aliado à coragem e disposição de luta dos estudantes e trabalhadores, um programa para derrotar o governo Dilma e conseguir as conquistas mais avançadas possíveis, ao mesmo tempo em que orienta os grevistas sobre qual deve ser o seu objetivo estratégico.