Este panfleto foi originalmente distribuído na Plenária Ampliada da ANEL/RJ, ocorrida em 21 de março. A versão aqui disponível contém pequenas correções na grafia e na formatação do texto.
Tendo em vista a preparação para a plenária nacional da Assembleia Nacional dos Estudantes – Livre, encaramos como fundamental debater o rumo que a sua direção majoritária, eleita no último congresso e composta por membros de liderança do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) tem dado à organização estudantil. Com esta breve polêmica, temos o objetivo de iniciar uma reflexão e um debate com os estudantes da base da ANEL sobre quais os rumos corretos para garantir que a entidade vai cumprir os seus objetivos finais de garantir para os estudantes brasileiros uma educação pública, gratuita, laica e de qualidade. Acesse nosso blog ou fale com nossos militantes e vamos juntos lutar por um movimento estudantil realmente capaz de promover grandes mudanças!
I
Nossa primeira diferença com a direção majoritária da ANEL diz respeito aos apelos que a entidade tem sistematicamente feito para que Dilma (e o PT) defendam os trabalhadores e estudantes, revogando medidas de ataque à educação, pedindo mais verbas ou mesmo exigindo da presidenta que exproprie o terreno do Pinheirinho e o dê aos trabalhadores que de lá foram brutalmente expulsos pelo governo estadual do PSDB de Alckmin. Isso fica claro nos seguintes trechos publicados nos boletins e no site da ANEL:
“Para garantir uma educação pública e de qualidade, precisamos exigir da Dilma que revogue os cortes no orçamento e garanta 10% do PIB para a educação já!”
Chega de cortes na Educação! 10% do PIB JÁ!
“Aproveitaremos a imprensa lá presente para divulgar nossas posições, além de exigir do governo mais verbas para a educação pública já.”
ANEL participa de reunião com relator do PNE, em Brasília
“Após a invasão do Pinheirinho, o governo Dilma afirmou que havia ocorrido uma ‘barbárie’. Porém, se Dilma acha realmente que o povo do Pinheirinho deve ter direito à moradia, por que não desapropria o terreno, já que tem pleno poder para isso? Devemos exigir que o governo federal faça jus às suas declarações e intervenha com a autoridade que tem em favor das famílias desabrigadas.”
Boletim Especial da ANEL – Fevereiro/Março
Estes exemplos mostram que a linha central da ANEL em diversas ocasiões e questões políticas variadas tem sido fazer apelos à Dilma para que resolva os problemas apontados. O fato de o governo do PT em aliança com o grosso da burguesia brasileira ter teoricamente “pleno poder” para dar um rumo diferente à educação e às ocupações de terra do país não muda o fato de que esse poder só pode ser usado na defesa dos interesses do grande capital, que possibilitou que Dilma fosse eleita e com o qual o PT tem estado de braços dados há décadas. A oposição que a ANEL tem feito contra o governo Dilma fica bastante enfraquecida com esses recorrentes chamados para que ela aja em favor dos estudantes e dos trabalhadores. Isto está muito errado e só serve para criar ilusões nos estudantes de que fazer pressão sobre o governo pode ser uma saída para resolver problemas tão agudos quanto a falta de verbas para educação ou a questão habitacional no Brasil.
Ao invés de agir como instrumento de pressão sobre o governo, a ANEL deveria deixar claro nos seus boletins que o governo Dilma é comprometido com os empresários e banqueiros brasileiros e dos países imperialistas, e que nunca será capaz de defender as demandas dos estudantes, trabalhadores e oprimidos. Se compreendida como a principal linha da ANEL nessas questões, esta posição de “exigências” dá um viés claramente reformista à entidade, quando na verdade o movimento estudantil e dos trabalhadores tem potencial para ser muito mais do que instrumento de pressão sobre o governo do PT em aliança com os patrões. Nós defendemos uma virada para uma política consistente de oposição a Dilma e que, contra o seu governo de conciliação com a burguesia, contraponha uma alternativa de poder da classe trabalhadora e dos estudantes, como um objetivo a ser conquistado através das lutas de classe. “Façamos nós por nossas mãos tudo o que a nós diz respeito!”
II
A ANEL tem dado apoio às “greves” e movimentos de policiais civis e militares pelo Brasil, que são a favor das “melhorias de condições de trabalho e de salários”, além da PEC 300, que é um projeto de emenda à constituição para aumentar o piso salarial dos policiais brasileiros. Por exemplo, em uma nota da ANEL do Maranhão:
“O aumento salarial de 30% e melhorias nas condições de trabalho [para os policiais] são mais que necessárias para que possam fazer o seu trabalho de proteção à população maranhense. Uma categoria que fica submissa aos mandos e desmandos do governo não pode deixar de lutar e garantir seus direitos! Contem com o apoio e solidariedade dos estudantes livres da Anel! Resistir é preciso! Nenhuma confiança no governo e em seus deputados! Todo apoio a luta dos PMs e Bombeiros do Maranhão!”
Nós nos opomos fortemente a tal posição. Partimos da compreensão de que os policiais não são parte da classe trabalhadora. O fato de que os policiais são assalariados não pode obscurecer a realidade de que o seu “trabalho” fundamental é garantir a manutenção da ordem capitalista protegendo a propriedade privada. O trabalho dos policiais maranhenses ou de qualquer outro estado não é “defender a população” como quer fazer parecer esta nota escrita pela Direção Majoritária da ANEL. Pelo contrário, como demonstrado historicamente, o trabalho dos policiais é defender o Estado e os capitalistas contra quaisquer investidas, inclusive e principalmente a revolta das classes oprimidas. Perceber isso não exige nenhuma abstração muito grande: qualquer ativista estudantil que tenha enfrentado a repressão policial em um protesto ou qualquer trabalhador que viu a forma como a polícia age com as greves combativas dos verdadeiros trabalhadores é capaz de testemunhar o mesmo.
Nós obviamente nos opomos à repressão do Estado desencadeada contra tais movimentos de policiais, pois elas podem facilmente se voltar contra as lutas dos trabalhadores e estudantes. Mas nós não podemos apoiar uma luta cujo objetivo é melhorar os salários e as “condições de trabalho” da polícia. Melhorar as condições de trabalho da polícia é melhorar as suas condições de reprimir os trabalhadores, o movimento estudantil e a esquerda em geral. Melhorar os salários dos policiais é fazer com que mais pessoas se sintam inclinadas a ingressar nas forças policiais. Isso é uma política suicida para uma organização de luta de qualquer tipo e ainda mais uma que se coloca em oposição ao governo. Em última instância, a vitória dessas lutas dos policiais levaria a um revés para os objetivos de um movimento que desejasse combater o poder do Estado capitalista. Para uma polêmica mais completa contra esta posição, sugerimos nosso documento O Vermelho Deles e o Nosso disponível em nosso blog. Policial não é trabalhador, é braço armado do explorador!
III
Nós acreditamos que o combate contra as opressões racista, machista e homofóbica são um ponto essencial que deve ser levantado pela ANEL. Mas o programa que a Direção Majoritária da ANEL tem defendido sobre essa questão tem sido, senão incorreto, totalmente insuficiente.
Sobre a questão da homofobia, por exemplo, a primeira coisa a se perceber é que também nesse campo a ANEL está fazendo chamados a Dilma para agir em defesa dos GLBTs. Mas o compromisso de Dilma com a bancada evangélica e com o Partido Progressista (PP) de Jair Bolsonaro, aliado do governo, a impedem de fazer isso. Outro ponto problemático é a insuficiência da defesa da lei que criminalizaria a homofobia (PLC 122). Embora a lei possa representar um avanço, ela seria aplicada pelo mesmo Estado burguês homofóbico, e não resolveria o problema. Por isso, ao lado de defender essa bandeira, que é a obrigação da ANEL, a entidade também deveria defender a formação de comitês de estudantes e trabalhadores nas universidades e escolas para vigilantemente defender os GLBT contra a opressão e ataques. Isso também iria mostrar que os GLBTs não precisam depender da polícia (que frequentemente também é bastante homofóbica) para se defenderem. Mas esta demanda fundamental está ausente da propaganda da Direção Majoritária da ANEL, assim como da sua prática.