Stalinismo, revolução política e contrarrevolução

O movimento trotskista internacional e a teoria do Estado operário burocratizado aplicada ao bloco soviético (1953-91)

Reproduzimos a seguir, para fins de formação política, um artigo acadêmica sobre a história do movimento trotskista com o qual possuímos acordo em termos gerais. Ele foi escrito pelo historiador Marcio Lauria Monteiro [1] e foi originalmente publicado no livro Trótski em Permanência (Práxis Editorial) em 2023 (disponível em https://encontrotrotski.noblogs.org/post/2023/03/02/livro-do-evento-online-trotski-em-permanencia-2023/).

Também disponível em formato PDF em: https://archive.org/download/livro-trotski-em-permanencia-sintese-da-tese/%5BLivro%20Tr%C3%B3tski%20em%20Perman%C3%AAncia%5D%20S%C3%ADntese%20da%20tese.pdf.

Nos [tempos reacionários] a tarefa da vanguarda é antes de tudo não se deixar levar pelo refluxo: deve nadar contra a corrente. Se uma relação de forças desfavorável a impede de ocupar as posições que conquistou, deve ao menos conservar suas posições ideológicas, porque nelas se expressa a experiência caríssima do passado. Os tolos vão considerar esta política “sectária”. Na verdade, é o único meio de se preparar para uma nova onda tremenda com a maré histórica que se aproxima.

— Leon Trotski, 1937.

O trotskismo é uma das principais vertentes do socialismo do século XX. Um dos seus pilares teórico-programáticos, ademais da reivindicação da herança dos quatro primeiros congressos da Internacional Comunista / Terceira Internacional, da teoria da revolução permanente e do programa transitório, são as análises de Leon Trotski e da Oposição de Esquerda Internacional / Quarta Internacional sobre o que era a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Tais análises buscavam compreender os desvios entre o que se tornara a URSS e o projeto original da Revolução Soviética, sobretudo a formação de um regime político conservador e de ditadura da burocracia, ao invés do regime revolucionário-internacionalista e de democracia proletária dos soviets. Elas também buscavam dar respostas políticas à questão de como superar essa ditadura da burocracia e fazer avançar a revolução socialista mundial.

Tais análises e as posições políticas a ela vinculadas formam o que chamaremos aqui de teoria do Estado operário burocratizado, uma vez que tinham como conceito central o de que a URSS havia se transformado, na virada dos anos 1920-30, em um “Estado operário burocraticamente degenerado”.

A teoria do Estado operário burocratizado e a falta de estudos sobre seu desenvolvimento pós-Trotski

O conceito de Estado operário burocraticamente degenerado designa uma sociedade de transição entre o capitalismo e o socialismo que, apesar de preservar as “conquistas sociais” da revolução social de 1917 (a tomada do poder estatal pelo proletariado e a posterior socialização dos meios de produção), passou a ter, em dado momento, um regime político equivalente ao bonapartismo das formações sociais capitalistas, baseado no monopólio do poder político por uma burocracia dotada de autonomia relativa frente ao proletariado. Tal regime foi nomeado de “stalinismo” pelo papel de Joseph Stalin enquanto principal organizador e líder dessa burocracia.

Conforme a teoria do Estado operário burocratizado, esse regime era fruto das contradições decorrentes do isolamento internacional da URSS, do atraso de suas forças produtivas e da devastação humana e material causada pela guerra civil. Ademais, tal regime bloqueava a concretização da transição ao socialismo, por perpetuar o isolamento internacional devido a seu conservadorismo contrarrevolucionário no plano internacional (“coexistência pacífica” com o imperialismo / “socialismo em um só país”) e por assumir papel de freio ao desenvolvimento das forças produtivas a partir do momento em que elas se tornam mais complexas (pelo seu caráter ditatorial e hipercentralizado, contraditório com as necessidades de inovação tecnológica e gestão flexível e democrática demandadas pela propriedade socializada).

Assim, tal regime deveria ser removido, através de uma “revolução política”, que reestabelecesse o poder político ao proletariado e a seus órgãos de autogoverno (soviets). A revolução política, contudo, não resolveria sozinha o problema, sendo também necessário o avanço da revolução mundial, para remover a URSS do seu isolamento. Caso esses elementos não se concretizassem, o regime stalinista (ditadura da burocracia) poderia levar, por vias diversas, a uma contrarrevolução que restaurasse o Estado burguês e a propriedade privada dos meios de produção, ao prolongar o isolamento internacional do Estado operário, bloquear o desenvolvimento das suas forças produtivas e gerar o surgimento de setores da própria burocracia interessados em uma conversão em burguesia, para assegurarem sua forma de vida privilegiada.

Em poucas linhas, essa é a teoria do Estado operário burocratizado em sua forma original, desenvolvida para explicar a URSS dos anos 1930 e para delinear um programa de ação para a oposição proletária e socialista-revolucionária à ditadura da burocracia / stalinismo.[2] Contudo, sua elaboração não ficou limitada aos escritos de Trotski, menos ainda à década de 1930. Tal teoria é fruto de elaborações coletivas, dos membros da Oposição de Esquerda Internacional / Quarta Internacional, e seguiu sendo desenvolvida nas décadas posteriores para dar conta de novos fenômenos.

Não obstante, a bibliografia existente sobre o tema tende a se limitar às elaborações pessoais de Trotski e desconsidera, assim, as formas pelas quais elas foram apropriadas pelo movimento trotskista internacional, especialmente do período pós-Segunda Guerra Mundial, que buscou aplicá-las e atualizá-las diante de novos fenômenos. Tais apropriações são marcadas pela aparição de formações sociais equivalentes à URSS no Leste Europeu e outras partes do mundo (China, Coreia do Norte, Vietnã e Cuba) e pelos desenvolvimentos posteriores da própria URSS, que apresentaram novos elementos para a teoria do Estado operário burocratizado. Essas apropriação, ademais, são marcadas pela grande fragmentação organizativa e teórico-programática que afetou o movimento trotskista após o assassinato de Trotski (em 1940), levando a releituras diversas do arcabouço original da Quarta Internacional.

Portanto, abordar a teoria do Estado operário burocratizado sem levar em conta tal desenvolvimento significa desconsiderar a historicidade dessa teoria, que, desde o início, foi elaborada com o objetivo político de ser um “guia para ação” e, por consequência, é dotada de dinâmica para responder à própria realidade contraditória e em desenvolvimento da URSS e do stalinismo. Não se trata, portanto, de uma análise engessada, do tipo “modelo sociológico” ou “tipo ideal”. Sem levar isso em conta, não é possível realizar um balanço aprofundado da sua validade explicativa e programática.

Ademais, desconsiderar as formas pelas quais os diferentes grupos trotskistas surgidos ao longo do pós-guerra se apropriaram do arcabouço teórico-programático original e buscaram aplicá-lo diante de situações concretas impede uma compreensão mais apurada de suas identidades políticas reais, isto é, para além das suas declarações formais de adesão a tal arcabouço. Impede, portanto, uma compreensão sobre as diferenças existentes entre esses grupos e o processo de fragmentação do trotskismo “pós-Trotski”, no que os debates acerca dos Estados operários têm grande importância, ainda que não sejam o único elemento a ser considerado.[3]

Não obstante, na bibliografia existente sobre o trotskismo e, de forma mais geral, sobre o marxismo no século XX, no que tange à questão da URSS, predomina uma análise limitada às ideias de Trotski, deixando quase que completamente de lado a apropriação posterior pelo movimento trotskista do pós-guerra. Quando muito, se leva em conta as elaborações de algumas figuras desse movimento que obtiveram certo destaque acadêmico, em particular Ernest Mandel. Porém, mesmo isso é feito de forma em geral superficial, ao não levar em conta seu pertencimento a uma organização política internacional, que possuía elaboração própria, não limitada à de tal figura.[4]

Essa situação, muito provavelmente, é fruto tanto de um certo “academicismo”, que tende a valorizar mais as contribuições de figuras de inserção acadêmica em detrimento das elaborações coletivas das organizações políticas às quais elas pertenciam, quanto pelo estágio ainda muito incipiente dos estudos sobre a história do movimento trotskista internacional pós-Trotski.[5]

O presente texto é fruto de nossa tese de doutorado, que teve o intuito de contribuir para superação de tal problema, de ausência de um estudo histórico e bem documentado sobre as apropriações da teoria do Estado operário burocratizado pelo movimento trotskista internacional pós-Trotski e o que elas nos dizem sobre as identidades teórico-programáticas dos diferentes grupos que disputam o legado do trotskismo.[6] Para tal, mapeamos e analisamos tais apropriações feitas por algumas das principais organizações trotskistas internacionais dos anos 1950-80, a partir de um volumoso trabalho com fontes primárias, nas quais estão as análises e posições dessas organizações em relação a alguns eventos-chave ocorridos nesses anos tanto na URSS como em alguns países do chamado “bloco soviético” no Leste Europeu que colocaram em questão a possibilidade de uma mudança do regime de ditadura da burocracia (stalinismo).[7]

Dividimos esse recorte temporal em três períodos.  Os anos 1950-60, marcados por tentativas de reformas limitadas por parte da burocracia, por um lado, e revoltas populares e proletárias por um socialismo democrático, por outro, incluindo uma genuína revolução (derrotada, na Hungria). Os anos 1970-80 na Polônia, que é um caso emblemático de passagem da oposição de massas de um programa claramente socialista (nos anos 1960) a um programa pró-capitalista, ainda que marcado por muitas contradições (na forma do “Solidariedade”) – o prelúdio do que viria a ocorrer adiante no conjunto do bloco soviético. A segunda metade dos anos 1980, marcada por uma nova rodada de tentativas das burocracias em reformar seus regimes (em especial o mecanismo de planejamento econômico), com destaque para as reformas de Gorbachev na URSS, e pela entrada em cena de oposições de massas pró-democráticas, porém sem terem mais o socialismo como um norte e compartilhando de muitas ilusões numa restauração capitalista, a qual acabou por se efetivar, na forma de uma reação democrática combinada à conversão de setores da burocracia em burguesia.

Buscamos, com isso, avaliar a validade da teoria tanto em sua forma original, quanto nessas apropriações posteriores, bem como ressaltar as diferenças teórico-programáticas que fizeram parte do processo de fragmentação do trotskismo pós-Trotski. Também levantamos algumas hipóteses sobre as possíveis raízes sociais dessas apropriações diversas.

Os grupos abordados foram a Quarta Internacional “propriamente dita”, no período 1953-63; o principal racha do pós-guerra, surgido em 1953, o “Comitê Internacional da Quarta Internacional” (posteriormente identificado como o tronco “healyista” do trotskismo internacional, a partir dos anos 1970); a organização surgida da reunificação parcial desses dois grupos, em 1963, o “Secretariado Unificado da Quarta Internacional” (posteriormente identificado como o tronco “mandelista”, a partir dos anos 1970); a “Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional” (o tronco “morenista”), fundada em 1982; e o “Comitê de Organização e Reconstrução da Quarta Internacional” (1971-79) e seu sucessor, o “Centro Internacional pela Reconstrução da Quarta Internacional” (1982-93) (o tronco “lambertista”). Também foram abordadas organizações nacionais de alguns desses agrupamentos (Quarta Internacional, Comitê Internacional e Secretariado Unificado) nos períodos em que eles eram mais heterogêneos, os anos 1950-60.

A conclusão a que chegamos é que, apesar de alguns problemas, na sua essência a teoria do Estado operário burocratizado em sua forma “original” se mostra como o melhor arsenal conceitual e analítico para explicar o desenvolvimento da URSS e das demais formações sociais surgidas das revoluções sociais anti-burguesas do século XX.[8] O mesmo, contudo, não pode ser dito da maior parte das apropriações dela feitas pelos grupos trotskistas internacionais do pós-guerra. Por mais que, em vários sentidos, os grupos abordados tenham realizado análises adequadas dos aspectos mais gerais das situações em foco (ao menos até 1988), as suas respostas políticas com frequência se desviaram daquilo que condizia com o arcabouço teórico-programático original, e se mostraram inadequadas frente às situações nas quais buscavam incidir. Ademais, houve ocasiões – em especial o período 1989-91 – em que até mesmo as análises das situações concretas se mostraram bastante inadequadas, ainda que levando em consideração as muitas dificuldades de uma análise feita no calor do momento.

A nosso ver, essa apropriação inadequada da teoria do Estado operário burocratizado é parte integrante da crise do trotskismo no pós-guerra, ou seja, a sua crescente fragmentação teórico-programática e organizativa, e constitui um elemento indispensável para a devida compreensão dessa crise, ainda que não seja seu único componente.

Uma síntese das apropriações da teoria pelos trotskistas “pós-Trotski”

Apresentamos a seguir uma síntese grupo a grupo dos achados da nossa pesquisa, mas alertamos que a leitura da nossa tese apresenta um quadro muito mais rico do que o que se segue, pois nela é possível acompanhar o desenvolvimento detalhados das análises e posições de cada grupo ao longo do tempo e melhor relacionar tal desenvolvimento com o contexto em que ele ocorreu e os eventos aos quais ele buscou responder. Inclusive, para não sobrecarregar o texto, faremos referência apenas aos documentos de síntese das posições aqui expostas, ao passo que na tese há referências a um grande número de fontes históricas, abordadas de forma detalhada para sustentar nossas análises e avaliações (procedimento que se mostrou necessário, inclusive, por conta das muitas polêmicas que cercam o passado das organizações abordadas e que seguem sendo travados entre a militância trotskista no presente).

Dos setores do movimento trotskista que analisamos, aquele que mais claramente se distanciou do arcabouçou teórico-programático original do movimento foi justamente seu setor majoritário, a Quarta Internacional “propriamente dita”, que ficou conhecida como QI (Secretariado Internacional) a partir do racha de 1953 e como QI (Secretariado Unificado) a partir da reunificação parcial de 1963. Em nossa avaliação, tal distanciamento não significou uma atualização ou correção adequada, mas uma adaptação objetivista, cujas posições práticas se mostraram equivocadas diante do desenrolar dos eventos em foco.

Em nossa dissertação de mestrado já havia sido identificado um abandono da estratégia revolucionária original do trotskismo por esse setor, em prol de uma estratégia gradualista, que passava por fazer alianças com forças políticas não-marxistas com influência de massas, na perspectiva de que estas chegassem ao poder e pudessem ser “empurradas” para concluir um processo de expropriação da burguesia e construção de um Estado operário. Também em nossa dissertação de mestrado, já havia sido identificada uma postura de apoio político às forças stalinistas, sempre que estas se distanciavam de posições mais canônicas emanadas desde Moscou (como na condução, numericamente excepcional, de revoluções sociais triunfantes), por considerar que, com isso, deixavam de ser stalinistas de fato. Desvios semelhantes foram detectados nesta pesquisa em relação à questão da revolução política e da possibilidade de uma autorreforma dos regimes stalinistas.

No primeiro período analisado, os anos 1950-60, foi possível ver que a QI (SI) / QI (SU), ainda que reivindicando formalmente a revolução política como solução para o stalinismo, adotou a noção de autorreforma da burocracia diante da aparição de alas reformadoras nos PCs e regimes do Leste.

Diante das revoltas alemã de 1953 e polonesa de 1956 e da Revolução Húngara de 1956, esse setor do trotskismo apostou em uma estratégia de democratização dos partidos stalinistas através da pressão das massas, e na possibilidade de setores reformadores da burocracia de fato eliminarem o regime ditatorial, deixando de lado a estratégia de construção de um partido trotskista independente da burocracia para liderar uma ruptura revolucionária do aparato estatal burocrático. Isso foi feito de forma bastante explícita a partir da iniciativa de Michel Pablo e seus aliados, em 1953 (ver DÉCLARATION, 1953, sobre a revolta alemã, e BILAN, 1956, sobre a Revolução Húngara de 1956), mas se manteve ainda que de formas atenuadas a partir do maior peso obtido pelo trio Ernest Mandel – Pierre Frank – Livio Maitain na liderança internacional, alguns anos depois.

Em relação à Revolução Húngara, ainda que tenha defendido uma derrubada do regime burocrático, esse grupo apostou na democratização do PC, ao invés da formação de um partido trotskista (ver LONG, 1956). De forma semelhante, em relação à Primavera de Praga (1968), defendeu um “autogoverno” das massas, mas sem uma estratégia de como conquistá-lo, tendo, num primeiro momento, apoiado a figura de Dubček, crendo que ele seria capaz de alterar qualitativamente o regime ditatorial a partir de reformas, além de também ter apostado na democratização do PC tchecoslovaco (ver DÉCLARATION, 1968 e CZECHOSLOVAKIA, 1968).

Assim, é possível afirmarmos que, quando o enfrentamento das massas com o regime se intensificava, esse setor do trotskismo tendia a apostar menos numa estratégia de autorreforma, ainda que mantendo elementos de apoio político às forças stalinistas reformadoras.

Isso se fez presente de forma mais marcante no segundo período analisado, o caso polonês da virada dos anos 1970-80. Como não só houve um intenso enfrentamento entre a oposição de massas e o regime, como também o surgimento de uma influente organização independente da burocracia (o Solidariedade), a QI (SU) “mandelista” não apresentou ilusões em uma autorreforma do regime, nem em uma reforma do partido que o sustentava, tendo mantido uma postura de firme oposição, denunciando o regime burocrático como causador de graves problemas econômicos e defendendo sua superação.

Não obstante, oscilou entre uma estratégia de revolução e uma de reforma (gradualismo – democratização através do espalhamento de órgãos de autogestão). Ademais, a mesma secundarização da necessidade de uma liderança marxista se fez presente nesse caso, com a organização tendo assumido uma postura de apoio entusiasmado em relação à liderança do Solidariedade, a despeito da hegemonia nesta de forças pró-capitalistas (ver EDITORIAL, 1980; MACDONALD, 1981; ALLIO, 1981a).

Um elemento novo de grande importância foi desconsideração ao abandono da defesa do socialismo por parte dos principais líderes oposicionistas – já perceptível com o KOR, em contraste com a oposição dos anos 1950-60, e depois mais claramente com o programa econômico pró-mercado adotado no I Congresso do Solidariedade. Por vezes a organização minimizou a relevância desse elemento, mas, na maior parte do tempo, simplesmente negou tal fato, não enxergando a mudança pela qual passara a oposição a partir do fracasso das experiências anteriores de reformas limitadas e revoltas populares (ver DEFENSE, 1981; ALLIO, 1981b). Assim, apostou no Solidariedade como sujeito político da revolução política. Com base nessa caracterização, condenou sua supressão pela burocracia em 1981 (ver EDITORIAL, 1982a; RÉVOLUTION, 1982).[9]

Com o tempo, esse último elemento assumiu a forma de negação de que mobilizações de massas pudessem servir a uma contrarrevolução, pois esta não seria dos interesses objetivos das massas. A QI (SU), portanto, operou com uma visão objetivista, não só por secundarizar o elemento do “fator consciente” na luta pela democracia socialista (o partido trotskista) como negar que as massas pudessem ser levadas a defender projetos contrários a seus interesses históricos. Também operou com uma postura subistitucionista, de apoio a forças não comprometidas com uma estratégia revolucionária e com o socialismo, se deixando levar pelo teor democrático de seu programa.

Quando dos eventos do terceiro período analisado, a QI (SU) “mandelista”, por um lado, se mostrou inicialmente cética em relação às promessas de reforma de Gorbachev, denunciou o regime burocrático como responsável pela economia cada vez mais deficiente, e defendeu que era essencial a democratização da gestão econômica para que as forças produtivas pudessem se desenvolver adequadamente (ver MANDEL, 1985). Por outro, viu com entusiasmo as reformas políticas ao longo de 1988, quando elas se aprofundaram, acreditando estar em curso uma superação do stalinismo (ver, p. ex., SEPPO, 1987 e MANDEL, 1988).

A QI (SU) corrigiu essa orientação ao final de 1988, e afirmou que apenas uma revolução política poderia findar a ditadura da burocracia, sendo uma autorreforma do regime impossível (REFORMS, 1989). Porém, ela tardou até pelo menos 1990 a enxergar as contradições dos “grupos sociais” e dos movimentos nacionais que haviam entrado em cena na URSS, cujas lideranças e programas iam de uma defesa contraditória do socialismo e de relações de mercado até posições mais abertamente pró-capitalistas (ver SEPPO, 1990).

Mesmo percebendo os riscos envolvidos nas lideranças e programas de setores da oposição e nas ilusões das massas mobilizadas, a QI (SU) seguiu defendendo as demandas por independência nacional, sem nenhuma vinculação dessa defesa com a manutenção dos Estados operários (ver, p. ex., FOLEY, 1990). Também, quando do golpe de agosto de 1991 na URSS, se posicionou do lado de Ieltsin e seus aliados, mesmo reconhecendo serem restauracionistas, por encarar que a derrota do golpe salvaguardaria as liberdades democráticas conquistas do período anterior (UNITED, 1992).

Assim, tal grupo colocou a defesa de direitos democráticos em primeiro plano, acima e desvinculados da defesa do conteúdo social do Estado operário. Essa secundarização da defesa do Estado operário, ainda que não intencional e não declarada, também pode ser vista no fato de que a organização defendia o desarmamento mesmo que unilateral da URSS como forma de enfraquecer a corrida armamentista (KLEIN, 1985), e na sua defesa da desocupação do Afeganistão, mesmo que isso desse lugar às organizações fundamentalistas ligadas ao imperialismo dos EUA (UNITED, 1988).

Parece ter pesado para tais posições a consideração de que seria impossível que as massas trabalhadoras pudessem se engajar em movimentos que tivessem como objetivo uma contrarrevolução restauracionista, pois isso iria contra seus interesses materiais. Dessa forma, a entrada em cena de tais massas, independentemente da liderança à sua frente e do programa por ela defendido, tenderia a ter caráter progressista – ou, no mínimo, não poderia representar um risco ao Estado operário (ver, p. ex. MANDEL, 1989a; MANDEL, 1989b).

O processo de restauração na RDA parece ter sido a causa da mencionada mudança de percepção em relação à oposição na URSS, uma vez que foi apoiado por grandes massas, através da demanda de reunificação nacional imediata. Percebendo os riscos que isso representava, a QI (SU) se posicionou contra a reunificação naquele momento e defendeu a necessidade de forjar uma liderança marxista para lutar contra as ilusões populares no capitalismo e nacionalismo (MILLIONS, 1989). Nesse caso, teve uma postura mais condizente com a defesa do Estado operário e da revolução política.

Contudo, o mesmo não ocorreu em relação à Polônia. O contato mais próximo com setores socialistas da oposição no país ao longo dos anos 1980 levou a QI (SU) a ser muito mais crítica da liderança do Solidariedade, reconhecendo seu caráter pró-capitalista e subordinado ao imperialismo (p. ex., WILKINS, 1986). Não obstante, a organização seguiu encarando que o Solidariedade deveria ser o sujeito político da revolução política no país e não levou em conta as ilusões no capitalismo por parte das massas mobilizadas (p. ex., SMUGA, 1989). Ademais, quando o Solidariedade chegou ao poder, a QI (SU) tratou como prioritário remover os elementos restantes da burocracia no Estado, mesmo reconhecendo que os membros do Solidariedade estavam encaminhando uma restauração capitalista (p. ex., MANDEL, 1989b; SMUGA, 1990a).

Assim, ademais do objetivismo e de um apego formal à democracia, desvinculada de conteúdo social, nesse terceiro período analisado, a QI (SU) tratou a burocracia em bloco como o inimigo principal e principal fonte de risco restauracionista, mesmo quando eram outros setores que a impulsionavam (caso da Polônia), ou quando havia divisões no interior da burocracia que poderiam ser exploradas para dar uma sobrevida ao Estado operário (caso da URSS). Ao mesmo tempo, a QI (SU) teve um colaborador participando do governo contrarrevolucionário tchecoslovaco, Petr Uhl.

Por fim, a QI (SU) não reconheceu a mudança qualitativa que houve ao nível do poder político nos Estados operários burocratizados do Leste, tendo avaliado que estava em curso na região um processo de restauração gradual. No lugar de enxergar contrarrevolução como mudança no poder político, a organização focou em aspectos econômicos, sobretudo na privatização das grandes empresas. Isso pode ser visto como uma posição espelhada em relação aos seus desvios acerca da possibilidade uma revolução social ou revolução política feita de forma gradual, ao invés de necessitarem de uma ruptura do aparato Estatal (UNITED, 1992; MANDEL, 1992; MANDEL, 1994; SMUGA, 1990b). A exceção foi a RDA, onde a absorção pela RFA tornou mais explícito a existência de um momento de mudança qualitativa ao nível do poder de Estado (ON, 1991).

Muito provavelmente, parte dessas posições da QI (SU) foram fruto da combinação do fato da organização não ter ligações sólidas com setores da oposição no interior dos Estados operários, o que certamente dificultava avaliações mais precisas da situação, com pressões para romper mais rapidamente o isolamento ao qual os trotskistas foram historicamente submetidos, se adaptando a posições de maior aceitação nos meios em que os “mandelistas” atuavam, como movimentos pacifistas, ecologistas e estudantis / de juventude na Europa ocidental. Nestes movimentos tendia a predominar a defesa de direitos democráticos de forma desvinculada de um conteúdo de classe e também ilusões na possibilidade de reformar o capitalismo ou os Estados operários burocratizados, elementos que permearam as posições da QI (SU).

Por sua vez, os setores que romperam com a Quarta Internacional em 1953 para formar o “Comitê Internacional”, alegando defender a “ortodoxia” e o arcabouço teórico-programático original do trotskismo, por mais que tenham, de fato, tido uma proximidade maior desse arcabouço durante o primeiro período aqui analisado, não estiveram isentos de desvios relevantes em relação a ele. Já nos dois períodos posteriores, seus “sucessores” apresentaram desvios maiores em relação a tal arcabouço, ainda que diferentes daqueles da QI (SU).

Em nossa dissertação de mestrado já havia sido identificado esse problema, de um afastamento gradual do arcabouço original por parte desses setores, até culminar em um abandono da estratégia revolucionária original do trotskismo, ainda que, da parte de alguns dos componentes originais do CI, isso tenha se dado por uma via diferente daquela da QI (SI) / QI (SU) – ao invés de uma adaptação centrista ao stalinismo, teve lugar uma rejeição das suas contradições que levou a posturas sectárias.

No primeiro período analisado, os anos 1950-60, foi possível ver que o CI-QI teve uma postura mais condizente com o arcabouço teórico-programático do trotskismo pré-guerra. A organização manteve uma firme oposição às burocracias do Leste diante dos eventos abordados, incluindo às suas alas reformadoras, insistindo na necessidade de uma revolução política, na forma de uma ruptura revolucionária do aparato estatal, dirigida por um partido trotskista, para que a democracia socialista fosse alcançada. Assim, não se iludiu com as concessões parciais feitas pela burocracia, que não alteraram seu monopólio do poder político, nem se iludiram com vias alternativas supostamente mais fáceis para findar o regime, que não a revolução política (sobre a revolta alemã de 1953, ver EDITORS, 1953; PROLÉTAIRES, 1953; SPRENGER, 1953; sobre a revolta polonesa de 1956, ver REVOLUTION, 1956; BRABANT, 1956; sobre a Revolução Húngara, ver COMITÉ, 1956;  REVOLUTION, 1956; VIVE, 1956; HEALY, 1966).

Não obstante, houve alguns casos de equívocos e desvios por parte de alguns componentes do CI-QI – que, é bom lembrar, não era, nesse momento, uma organização internacional coesa e centralizada, mas um tipo de fórum internacional de grupos nacionais com algumas posições-chave em comum.

Diante das reformas limitadas e parciais feitas pela burocracia na URSS e seus países-satélites nos anos 1950, o SWP dos EUA negou dogmaticamente que o stalinismo pudesse prescindir do terror, de forma que encarou tais mudanças como concessões temporárias às massas, que logo seriam revertidas. Com isso, não reconheceu a possibilidade de os regimes stalinistas terem certas variações, que não afetavam seu elemento essencial (o monopólio do poder político pela burocracia) (ver AGAINST, 1953).

Em chave diferente, também houve desvios pontuais de grupos do CI-QI, na forma de apoio político a setores da burocracia, ou uso de um programa meramente democrático.

Diante do caso polonês de 1956, o PCI francês (La Vérité) apoiou a figura de Gomulka, encarando que ele e seus aliados não eram parte da burocracia, e que poderiam conduzir uma luta revolucionária contra ela (ver VIVE, 1956). Isso ecoava posições adotadas pelo PCI francês nos anos 1940, de ver mudanças no interior da burocracia como uma ruptura com o stalinismo, como fora o caso com o regime iugoslavo no final dos anos 1940, saudado pelo PCI (e outros setores da Quarta Internacional) como anti-stalinista por romper com Moscou.

Outro equívoco foi observado diante do caso húngaro de 1956, com a SLL inglesa tendo colocado a conquista da soberania nacional frente à URSS como uma tarefa anterior à revolução política, inclusive a ser conduzida junto a setores não-socialistas (GELDEREN, 1957).

Isso mostra que mesmo os autoproclamados trotskistas “ortodoxos” não estavam a salvo de contradições na busca por uma solução mais rápida para o problema do stalinismo no Leste Europeu. O caso mais claro disso é o do SWP dos EUA, que, a partir da Revolução Cubana, passou a adotar posições muito próximas àquelas da QI (SI) no sentido de secundarização do fator subjetivo na estratégia revolucionária (como na sua atuação no movimento negro dos anos 1960) e seu entusiasmo cada vez maior em relação ao regime cubano – o que culminou em sua saída do CI-QI e formação da QI (SU).

Diante do caso tchecoslovaco de 1968, os setores remanescentes da CI-QI mantiveram uma postura mais próxima dos princípios trotskistas originais, pois não depositaram confiança em Dubček, inclusive o tendo denunciado como restauracionista (o que nos parece um exagero), caracterizaram o PC local como centrista, como forma de dar conta das mudanças pelas quais ele passava, mas não abandonaram a defesa da necessidade de um partido trotskista independente da burocracia e seus aparatos, e defenderam uma estratégia de ruptura revolucionária (ver POLITICAL, 1968-1969).

Ademais, cabe destacar que, ao longo desse primeiro período, a questão nacional foi abordada pelo CI-QI e seus grupos como central para a revolução política no bloco soviético, mas sem com isso aderirem a um programa meramente democrático. Ao invés disso, vinculavam a defesa de independência / soberania nacional desses países à manutenção da propriedade social, na forma da defesa de repúblicas socialistas autônomas. Esse elemento, contudo, se perdeu no terceiro período abordado.

Já em relação ao caso polonês na virada dos anos 1970-80, o que restara do CI-QI teve postura bastante diferente. Então hegemonizado pela SLL / WRP da Inglaterra, que tornara o grupo uma internacional centralizada, o CI-QI “healysta” apoiou a figura de Walesa, não enxergando os riscos contrarrevolucionários que ele representava e mesmo sua postura de moderação das lutas operárias. Tampouco enxergou os riscos representados pelo programa econômico adotado pelo Solidariedade. Ao invés disso, o grupo viu no Solidariedade um importante ponto de apoio para a revolução política. Assim, condenou a sua supressão pela burocracia em 1981. Não obstante, manteve a defesa de que apenas uma revolução política, no sentido de ruptura revolucionária, poderia eliminar o regime stalinista, e que era necessário um partido trotskista à sua frente (ver EDITORIAL, 1981; EDITORIAL, 1982b).

O que podemos ver, portanto, é que, apesar de manter formalmente a defesa dos Estados operários burocratizados e a estratégia original do trotskismo, o CI-QI “healysta” se deixou levar pelo caráter de massas do Solidariedade e pela popularidade de Walesa enquanto líder sindical, ignorando os riscos que representavam. Podemos ver nisso um objetivismo, no sentido de crença de que o caráter proletário das massivas bases do Solidariedade o tornava, por si só, progressista, bem como o caráter “sindicalista” de Walesa e seus aliados asseguravam que ele não seria avesso aos interesses históricos do proletariado polonês.

Ainda que a falta de informação devido à distância possa ter sido um elemento nesses desvios, o fato de que à época o WRP, principal seção do CI-QI, havia estabelecido uma relação de apoio político e dependência material com regimes nacionalistas árabes indica que pode haver raízes sociais mais profundas e que sua reivindicação da ortodoxia trotskista já havia se tornado uma mera formalidade.

Devido à posterior explosão do WPR e do CI-QI, não foi possível analisar a postura dos “healystas” em relação aos eventos do terceiro período abordado.

Já da parte de um dos principais componentes do CI-QI pós-1963, o “lambertista” PCI francês (renomeado OCI no período entre 1966-81), vimos que, após romper com o CI-QI e formar o breve Comitê Paritário / QI-CI junto às forças latino-americanos lideradas por Nahuel Moreno (1980-81), bem como após formar a QI (CIR), em dezembro de 1981, os “lambertistas” também mantiveram uma reivindicação formal da defesa dos Estados operários burocratizados, da estratégia de revolução política e da necessidade de um partido trotskista à sua frente, em contraste com o que foi visto da parte da QI (SU). Contudo, essa reivindicação formal não impediu sérios erros de análise e de posicionamento por parte do grupo.

Em relação ao caso polonês da virada dos anos 1970-80, os “lambertistas”, tal qual seus antigos aliados ingleses, mantiveram firme oposição ao regime burocrático, mas não viram riscos contrarrevolucionários no programa adotado pelo Solidariedade, nem na figura de Walesa e seus aliados, criticados apenas por sua moderação e postura conciliatória. Ao invés, igualmente viram no Solidariedade um importante ponto de apoio para a revolução política na Polônia. Assim, condenaram sua supressão pela burocracia em 1981 (ver FAVRE, 1982 e REVOLUÇÃO, 1982). Tal qual em relação aos “healystas”, podemos ver nisso uma forma de objetivismo.

Os “lambertistas”, ademais, apesar de reivindicarem uma ruptura revolucionária do aparato estatal burocrático, liderada por um partido trotskista, introduziram um elemento até então novo na estratégia da revolução política: a convocação de uma Assembleia Constituinte. Com isso, mesclaram de forma contraditória a estratégia original, de uma insurreição baseada em órgãos de duplo poder proletários, com um elemento parlamentar de teor reformista – pois não pressupõe a destruição do aparato burocrático para findar a ditadura (ver PROYECTO, 1981 e RESOLUÇÃO, 1982).

Podemos supor que esse desvio democrático-reformista em relação à estratégia “soviética” original do trotskismo era uma forma de buscar romper rapidamente o isolamento das forças socialistas, pois o próprio QI (CI), no qual estavam então os “lambertistas”, o justificou como sendo uma forma de se aproximar de setores não-proletários e não-socialistas da oposição.

Esses elementos (ignorar os riscos contrarrevolucionários representados por setores da oposição de massas e dar uma nova forma, contraditória, à estratégia da revolução política) voltaram a se repetir, com maior intensidade e profundidade, diante dos eventos do terceiro período abordado.

Nesse período, os “lambertistas”, então agrupados na QI (CIR), mantiveram uma reivindicação formal da defesa dos Estados operários burocratizados, da revolução política e da necessidade de um partido trotskista à sua frente. Coerentemente, não se iludiram com a figura de Gorbachev e suas promessas de reformas, denunciando-as como um risco contrarrevolucionário (QUE, 1987). Idem para Ielsin e outras figuras burocráticas de oposição (G., 1989).

Contudo, a QI (CIR) não teve a mesma percepção em relação aos movimentos de oposição de massas e aos movimentos nacionais na URSS, a despeito das muitas contradições que perpassavam ambos e da defesa explícita e cada vez mais forte de uma restauração por setores de peso em seu interior. O grupo se limitou a criticar aqueles setores que tinham ilusões em uma reforma do regime stalinista (SUR, 1987). Mesmo reconhecendo a existência do que nomeava de “tendências burguesas” nos movimentos nacionais, não via neles uma ameça contrarrevolucionária, mas sim a “alavanca” da revolução política (DÉBAT, 1988). O único risco contrarrevolucionário que a QI (CIR) enxergou, ademais do imperialismo, foi em relação à própria burocracia, tida como restauracionista no seu conjunto (MARIE, 1990; RESOLUÇÃO, 1991).

Vimos, assim, que a organização claramente se pautou por uma percepção objetivista, de que as massas em luta contra o regime stalinista por demandas democráticas não poderiam impulsionar uma contrarrevolução, pois isso iria contra seus interesses de classe. Com isso, desconsiderou as lideranças e programas à frente dos movimentos de massas dos anos 1988-91 no bloco soviético. Assim, tomou o lado das manifestações lideradas por Ieltsin contra o golpe de agosto, pois foi o lado que parte significativa das massas então mobilizadas seguiu (EDITORIAL, 1991).

Outra face desse objetivismo foi um democratismo, no sentido da defesa em abstrato de demandas democráticas, sem considerar seu conteúdo social. Nesse sentido, defendeu as independências nacionais sem vinculá-las à manutenção da propriedade social e de um norte socialista (DÉBAT, 1988). De forma similar, na questão afegã, colocou em primeiro plano a defesa da autodeterminação nacional do povo afegão, ao invés da defesa das fronteiras do Estado operário burocratizado (FORGUE, 1989).

Apesar de não ter comemorado a dissolução da URSS (como fizeram os “morenistas), a QI (CIR) encarou que a destruição do aparato stalinista, por si só, garantiria um salto das lutas proletárias a nível mundial, ao eliminar uma das principais barreiras a elas – a “cooperação contrarrevolucionária” com o imperialismo, de forma que não viu tal fato como uma derrota histórica (REPROCLAMADA, 1993).

Essa visão unilateral da burocracia aliada ao imperialismo como sendo a única fonte de risco contrarrevolucionário dentro e fora dos Estados operários vinha de longe, de debates dos anos 1940, em que os setores que posteriormente formaram a QI (CIR) – sobretudo sua seção francesa – passaram a caracterizar a burocracia como intrinsecamente contrarrevolucionária, apagando as contradições que a teoria do Estado operário burocratizado reconhecia.

Tal visão foi ainda associada a uma negação de que a restauração capitalista seria possível nos Estados operários burocratizados, por uma suposta incapacidade do sistema capitalista em absorver suas forças produtivas. Assim, a QI (CIR), de forma semelhante à QI (SU), passou os anos 1990 não reconhecendo que a destruição dos aparatos estatais do bloco soviético significara uma contrarrevolução, encarnado que o lento avanço da privatização das economias da região o provavam, de forma que aquelas formações sociais seguiriam sendo Estados operários burocratizados (REPROCLAMADA, 1993; GLUCKSTEIN, 2004). Ademais, junto a isso estava uma visão impressionista de que o capitalismo enfrentava uma crise terminal e que havia um ascenso revolucionário em curso a nível mundial nos anos 1980 (REPROCLAMADA, 1993).

Em relação ao caso polonês, a QI (CIR) seguiu ignorando os riscos contrarrevolucionários representados por Walesa e seus aliados à frente do Solidariedade até pelo menos 1989 (p. ex., RÉSOLUTION, 1986) e, mesmo após reconhecê-los, minimizou seu peso, encarando que outros setores do Solidariedade tinham maior peso e eram contra a linha pró-capitalista – o que não procedia (p. ex., LANGEVIN, 1989).

Ainda que reconhecendo essa fonte de risco contrarrevolucionário, a QI (CIR) seguiu ignorando seu real peso dentro da oposição de massas, e dando maior ênfase à burocracia e sua relação com o imperialismo como fontes principais de risco. Ademais, seguiu encarando que o Solidariedade deveria ser a estrutura a encabeçar a revolução política na Polônia (LANGEVIN, 1990). Vemos, assim, a força dos referidos desvios objetivistas da QI (CIR), a despeito da sua reivindicação formal da revolução política.

Em relação ao caso alemão, os desvios da QI (CIR) se fizeram presentes de forma muito mais intensa, pois a organização ignorou qualquer risco contrarrevolucionário representado pela reunificação nacional da forma como estava sendo conduzida, ainda que tenha defendido que ela fosse feita em chave socialista e revolucionária (CORRESPONDANT, 1989;  XXXIVe, 1989). Mesmo após o triunfo da contrarrevolução, com a absorção da RDA pela RFA, a organização seguiu negando que a reunificação tivera tal significado, pois supostamente o capitalismo não seria capaz de absorver as forças produtivas da RDA e haveria uma situação revolucionária na RFA, com as massas de ambas as Alemanhas como as protagonistas da reunificação (p. ex., FORGUE, 1990). Assim, o objetivismo, ao não ser corrigido, se tornou pura negação da realidade.

Outro desvio relevante foi em relação à estratégia defendida pela QI (CIR) para a combinação da revolução política com a suposta revolução social na RFA. A organização, além de reivindicar o elemento democrático da Assembleia Constituinte como parte central da sua estratégia, incorrendo, pois, em um desvio reformista, também colocou no centro a demanda de um governo do SPD em toda a Alemanha – mesmo esta organização sendo abertamente pela restauração capitalista na RDA (XXXIVe, 1989).

Essa demanda em relação à socialdemocracia nos parece ser fruto da política seguida por várias seções da QI (CIR), em especial a francesa, de adaptação política à socialdemocracia como forma de romper seu isolamento.

Por sua vez, as forças latino-americanas lideradas por Nahuel Moreno, tendo composto o Comitê Internacional a partir de 1954 e depois participado da formação da QI (SU), em 1963, compuseram, nos anos 1980-81, o breve Comitê Paritário / CI (QI), antes de formarem a “morenista” LIT-QI, no final de 1981 e início de 1982. Essa trajetória peculiar, dos autoproclamados trotskistas “ortodoxos” do CI à reunificação com os “revisionistas” da QI (SI), não impediu as forças “morenistas” de se apresentarem como uma organização “ortodoxa” ao longo dos anos 1980.

De fato, elas tinham uma reivindicação formal da defesa dos Estados operários burocratizados, da estratégia de revolução política e da necessidade de um partido trotskista à sua frente. Todavia, assim como os “lambertistas”, os “morenistas” incorreram em graves erros de análise e posição, que configuravam desvios em relação ao arcabouço teórico-programático original do trotskismo.

Em relação ao segundo período analisado, o caso polonês da virada dos anos 1970-80, vimos que, após romperem com os “lambertistas” e formarem a LIT-QI, os “morenistas” passaram a denunciar Walesa e a direção do Solidariedade como contrarrevolucionários restauracionistas. Contudo, se pautaram por um desvio objetivista, de encarar que o ascenso das massas e do proletariado não poderia levar uma contrarrevolução, a despeito do caráter e programa da sua liderança. Por isso, encaravam que o Solidariedade era um elemento fundamental da revolução política, que deveria se guiar pela consigna de “todo o poder ao Solidariedade”, a despeito da sua liderança, de forma que foram contra sua supressão pela burocracia. Não obstante, a LIT-QI defendia a necessidade de formação de um partido trotskista, a partir da ala esquerda do Solidariedade, para conduzir a revolução política polonesa (ver MORENO, 1982).

De forma muito semelhante aos “lambertistas”, tal objetivismo se fez presente com intensidade e profundidade muito maior em relação os eventos do terceiro período abordado. Por um lado, os “morenistas” da LIT-QI não conferiram apoio político a Gorbachev e suas promessas de reformas em nenhum momento, denunciando-o como dependente do imperialismo e, a partir de meados de 1987, também como restauracionista  (EDITORIAL, 1986; SETENTA, 1987). Tampouco conferiram apoio a Ieltsin e outros setores da burocracia que tentaram se apresentar enquanto uma oposição democrática, vendo-os como igualmente restauracionistas e pró-imperialistas (p. ex., MASSA, 1990). Assim, mantiveram uma reivindicação formal da defesa dos Estados operários burocratizados, da revolução política e da necessidade de um partido trotskista à sua frente (CONYUNTURA, 1988).

Por outro lado, durante quase todo o período, a LIT-QI enxergou riscos restauracionistas apenas na burocracia e na sua relação com o imperialismo, ignorando, na maior parte do tempo, as ilusões no capitalismo por parte das massas mobilizadas e o programa e caráter pró-mercado das lideranças de parte da oposição pró-democracia e dos movimentos nacionais (p. ex., LUNA, 1988).  Também de forma semelhante aos “lambertistas”, o grupo apoiou de maneira incondicional das demandas por independência dos movimentos nacionais, sem vinculá-las à manutenção da propriedade social e de uma perspectiva socialista (p. ex., SECRETARIADO, 1988; REPÚBLICAS, 1988). No caso do Afeganistão, por mais que tenha defendido que o Exército Soviético conduzisse uma expropriação da burguesia antes de se retirar, colocou em primeiro plano a defesa da autodeterminação nacional afegã, defendendo a saída das tropas (CARRASCO, 1989).

Ainda que sem afirmá-lo de maneira explícita, a LIT-QI também se pautou por uma perspectiva objetivista, segundo a qual a mobilização das massas não poderia levar a uma restauração. Para o grupo, e isso afirmava com clareza, uma contrarrevolução seria, necessariamente, uma guerra civil sangrenta (p. ex., TESES, [1990]; CUELLO, 1990a).

Esse objetivismo tinha, entre os “morenistas”, uma forma mais elaborada do ponto de vista teórico-programático: a noção, desenvolvida por Moreno, de que revoluções sociais ocorrem em duas “fases”. Uma “inconsciente” / “democrática”, onde o proletariado derruba regimes políticos ao se mobilizar por um programa democrático junto a forças não-socialistas ou mesmo não-proletárias, que são as que tomam o poder nesse primeiro momento, formando regimes débeis (“kerenkistas”), que buscam encerrar o processo revolucionário e retroceder nas conquistas obtidas pelas massas. Outra “consciente” / “socialista”, onde o proletariado toma o poder para si, rompendo com tais forças, graças à liderança do partido trotskista, o qual se torna de massas ao longo da primeira fase, conforme o proletariado rompe suas ilusões a partir da experiência concreta com o regime que ajudou a erguer na primeira fase e também ao se fundir com forças centristas com influências de massas, na forma de uma “Frente Única Revolucionária”.

Essa lógica objetivista, que secundariza sobremaneira o fator subjetivo na revolução social na sua suposta “primeira fase”, e que prevê a unidade política com forças não-marxistas, foi transposta à revolução política ainda no começo dos anos 1980, diante da situação polonesa (MORENO, [1984]), mas foi diante dos eventos referentes ao terceiro período abordado que a LIT-QI a utilizou de forma sistemática para os Estados operários burocratizados. Com isso, estaria “resolvido” o problema das ilusões das massas no capitalismo e do programa e caráter restauracionista de boa parte das lideranças da oposição de massas – isso seria algo esperado na “primeira fase” da revolução política, após a qual é que se daria uma diferenciação entre socialistas e restauracionistas e um avanço de consciência das massas.

Ademais, durante parte de 1989-90, a LIT-QI descartou até mesmo a necessidade de um partido marxista para a superação da crise de direção e vitória das revoluções políticas. Através de uma análise extremamente otimista da situação no bloco soviético e no mundo como um todo, formalizada nas chamadas “Teses de 90” (mas presentes também em diversos outros documentos e artigos do período), a organização encarou que as massas, a partir da experiência prática nas mobilizações que compunham um suposto ascenso revolucionário a nível global, estavam construindo de forma espontânea novas organizações revolucionárias e órgãos de poder proletário (TESES, [1990]). Esse otimismo exacerbado foi momentaneamente corrigido, em meados de 1990, a partir de uma disputa interna (PRIMEIRA, [1990]), mas logo voltou a se fazer presente nas publicações da organização, tendo sido pivô de intensos conflitos ao longo dos anos seguintes.

Pautados por essa visão objetivista, e pelos desvios democratistas que ela impunha, uma vez que o programa da “primeira fase” da revolução deveria ser, segundo a própria LIT-QI, apenas democrático, os “morenistas” confundiram contrarrevolução com “fase democrática” da revolução política. Assim, comemoraram a vitória dos setores liderados por Ieltsin em agosto de 1991 e a dissolução da URSS como revoluções democráticas vitoriosas (GRAN, 1991; EDITORIAl, 1991; GONZÁLEZ e CUELLO, 1992). Inclusive, adotando uma postura eufórica e triunfalista, ignorou a ausência de uma liderança trotskista, encarando que a crise de direção já estava se resolvendo com a própria ação das massas e que a vitória final estava próxima.

Também vimos ter tido um grande peso nessas posições uma visão unilateral da burocracia, como intrinsecamente contrarrevolucionária, de forma que sua eliminação foi vista pela LIT-QI como um grande triunfo, independentemente da forma como se deu, pois supostamente liberaria forças revolucionárias a nível mundial (TESES, [1990]; MINUTA, 1990). Forças essas que, segundo uma visão impressionista, já estariam mobilizadas em um poderoso ascenso desde o começo dos anos 1980 (SITUACIÓN, [1985]).

Esses elementos se fizeram igualmente presentes no caso polonês, uma vez que os “morenistas”, apesar de, nesse caso, terem reconhecido desde cedo os riscos contrarrevolucionários representados pelo Solidariedade e sua liderança, seguiram defendendo a consigna de “todo poder ao Solidariedade” (EDITORIAL, 1989) e comemoraram a chegada da organização ao poder como uma revolução democrática, vendo tal evento como parte integrante do processo da revolução política (CUELLO, 1990b). Seria a sua primeira “fase”, de passagem por um governo contrarrevolucionário débil / “kerenkista”, que logo seria derrubado, assim que as massas superassem a crise de direção (processo que já estaria em curso, na avaliação das “Teses de 90”).

Idem para o caso alemão, em que a LIT-QI, ademais de objetivismo em relação às mobilizações das massas, ignorando os riscos de suas ilusões e do caráter e programa restauracionista de suas direções, negou a realidade, ao encarar que eram as massas que estavam conduzindo a reunificação, e que ela significaria a fusão de uma revolução política (na RDA) com uma social (na RFA) (ESTE, 1990). Por conta disso, o grupo demandou uma reunificação imediata e sem pré-condições, não subordinando o direito democrático à reunificação nacional à manutenção da propriedade social e do norte socialista (FE, 1990).

Apesar de ter aplicado a lógica da revolução em “fases” e visto na queda do Muro e de Honecker uma “revolução democrática”, a LIT-QI, contudo, reconheceu, em meados de 1990, que a reunificação significara uma contrarrevolução restauracionista (MINUTA, 1990). Contudo, não extraiu daí lições para repensar a situação na URSS, Polônia e restante da região, mantendo seu otimismo objetivista de que, nesses locais, “revoluções democráticas” haviam triunfado e que marchavam para a conclusão da revolução política (ESTE, 1990; RESOLUCIÓN, 1992).

Por fim, em relação ao conjunto do bloco soviético, à exceção da RDA, a LIT-QI encarou, também de forma objetivista, que a restauração capitalista não poderia triunfar, pois a crise econômica e política do imperialismo o impedia de absorver a região e os trabalhadores estavam resistindo às medidas de privatização dos governos “kerenkistas” (p. ex., CUELLO, 1990a). Assim, também como os “mandelistas” e “lambertistas”, os “morenistas” ignoraram a mudança qualitativa ao nível do poder de Estado como um triunfo da contrarrevolução, focando apenas em elementos econômicos. Por isso, assim como estes outros setores do movimento trotskista, por longos anos os “morenistas” caracterizavam que os Estados operários burocratizados do bloco soviético seguiam existindo e que a restauração acontecia de forma gradual (RESOLUCIÓN, 1992). Isso só foi alterado em 2005, através de uma nova análise do processo de restauração, que localiza seu início com a chegada de Gorbachev ao poder, de forma que encara que o colapso do bloco soviético teria sido um processo de revolução democrática contra ditaduras capitalistas (HERNÁNDEZ, 2008).

Apesar dos muitos problemas que perpassam a apropriação e aplicação da teoria do Estado operário burocratizado pelos principais grupos internacionais do movimento trotskista no segundo e terceiro períodos abordados, houve grupos que encaramos terem se destacado positivamente, em termos de terem apresentado uma apropriação e aplicação ao nosso ver adequadas para diante dos eventos em foco, tal qual o CI-QI em relação ao primeiro período.

Nos referimos em primeiro lugar à Spartacist League dos EUA (SL) e sua “internacional”, a “tendência Espartaquista internacional” (iSt), que durante os anos 1960-70 e parte dos 1980 manteve a defesa de uma estratégia de ruptura revolucionária para os Estados operários burocratizados, sem conferir apoio político a alas reformadoras da burocracia. Em contraste com outros grupos trotskistas da época, a SL / iSt tampouco se entusiasmou com e conferiu apoio político a movimentos de massas que, apesar de pró-democráticos, não tinham um compromisso com a propriedade social e demais conquistas da revolução social.

Em relação ao caso polonês da virada dos anos 1970-80, vimos que a SL / iSt identificou corretamente os riscos contrarrevolucionários representados pela liderança do Solidariedade, de forma que defendeu criticamente sua supressão pela ação da burocracia, quando esta implementou a Lei Marcial. Ao mesmo tempo, não deixou de defender, desde o início do processo de formação do Solidariedade e também durante a vigência da Lei Marcial, a necessidade de formação de uma partido trotskista que combatesse tanto a liderança do Solidariedade como também a burocracia stalinista, com objetivo de ganhar as bases proletárias do Solidariedade para o programa de defesa da propriedade social e do Estado operário, bem como de revolução política para instaurar um regime de democracia proletária (SOLIDARNOSC, 1981).

Contudo, a partir dos anos 1980, a SL / iSt apresentou inclinações contrárias a tais posições, no sentido de apostar primariamente na burocracia para a defesa do Estado operário burocratizado contra forças restauracionistas, ao invés de ver no proletariado o principal grupo social que deveria atuar pela defesa das conquistas da revolução social. Com essa posição, a SL / iSt assumiu, em certos momentos, uma reivindicação quase acrítica de certas ações repressivas por parte da burocracia stalinista contra forças restauracionistas, como no próprio caso de supressão do Solidariedade polonês, em 1981 (SOLIDARNOSC, 1981).

A nosso ver, essa “stalinofilia” era uma reação ao ambiente opressivo da Guerra Fria nos EUA, que fez com que boa parte da esquerda abandonasse a defesa do bloco soviético – ao que a SL / iSt parece ter reagido apagando as necessárias nuances que a complexidade do tema exigia em algumas ocasiões. Ademais, tal grupo passou por um processo de estagnação e transformação burocrática de sua vida interna no contexto de crescente isolamento que sofreu durante o refluxo da luta de classes nos EUA nos anos 1970-80, tendo assumido postura errática com relação a certos eventos políticos estadunidenses e mundiais.

Foi o caso de suas análises e posições contraditórias em relação aos eventos do terceiro período abordado – as quais, infelizmente, não houve tempo hábil para serem analisadas em profundidade no que tange o terceiro período abordado. A SL / iSt adotado uma postura de crítica à Gorbachev e Ieltsin, denunciando que suas promessas reformadoras e democráticas não significavam uma ruptura de fato com o regime de monopólio político da burocracia (stalinismo), mas um rearranjo de forças para salvaguardar tal regime. De forma semelhante, a organização foi crítica aos grupos sociais e movimentos nacionais surgidos na URSS ao longo da segunda metade dos anos 1980, denunciando suas lideranças e programas pró-capitalistas como riscos contrarrevolucionários que deveriam ser suprimidos (WHERE, 1987-1988).

Contudo, quando uma ala da burocracia agiu para remover Gorbachev e outros “reformadores” do poder, a SL / iSt adotou uma posição de neutralidade (WORKERS, 1991). Ademais, ela demorou a reconhecer o triunfo da contrarrevolução restauracionistas que significou a vitória do contragolpe de Ieltsin e seus aliados (WORKERS, 1994).

Ademais, a SL / iSt adotou uma postura de exagerado entusiasmo com os eventos na RDA, enxergando neles uma revolução política em curso, a despeito da ausência de lideranças e programas revolucionários, não tendo atentado para os riscos contrarrevolucionários em cena (p. ex., WORKERS, 1989; WORKERS, 1990).

Algumas dessas ponderações críticas com relação às posições da SL / iSt diante dos eventos no bloco soviético foram feitas à própria época pela Tendência Bolchevique Internacional (IBT), que se formou a partir de ex-membros dessa organização no início dos anos 1980 – organização que também não foi possível ser analisada em profundidade na Parte IV. A IBT é a segunda experiência política que acreditamos ter mantido maior coerência em relação à teoria do Estado operário burocratizado diante dos eventos aqui abordados.

Tal qual a SL / iSt, a IBT não conferiu apoio político a alas reformadoras da burocracia e defendeu a necessidade de uma revolução política nos moldes da formulação original do trotskismo, porém sem perder de vista os riscos contrarrevolucionários em cena durantes as mobilizações populares da segunda metade dos anos 1980 na URSS e demais países do bloco soviético. Ademais, a IBT não conferiu apoio político à burocracia para suprimir tais riscos, ainda que tenha defendido a “unidade de ação” pontual com setores da burocracia que pudessem agir, pelos seus próprios interesses, contra tais riscos.

A IBT criticou o que via como desvios “estalinofílicos” por parte da SL / iSt, de forma que, ao caracterizar os movimentos pró-democráticos e nacionalistas surgidos no interior do bloco soviético ao longo dos anos 1980 como potencialmente contrarrevolucionários apostou primariamente no proletariado como força social que deveria ser mobilizada para eliminar tal ameaça, ainda que aventando a possibilidade de alianças táticas com setores da burocracia que pudessem ajudar em tal tarefa política (WORLD, 1989; EASTERN, 1990; NATIONAL, 1991).

Tais posições podem ser vistas em sus críticas à Gorbachev, Ieltsin e outros “reformadores” como sendo apenas variantes do stalinismo (WORLD, 1989; EASTERN, 1990). Também no apoio crítico dado pela organização à supressão do Solidariedade polonês em 1981, que não envolveu concessões políticas nem nenhum nível de confiança na burocracia, diferentemente da SL / iSt (SOLIDARNOSC, 1988), bem como em seu apoio crítico ao golpe de agosto de 1991 na URSS, o qual a organização acreditava que, se vitorioso, poderia dar uma sobrevida ao Estado operário burocratizado e dar tempo, assim, para que o proletariado se organizasse para realizar uma revolução política (DEFEND, 1992; THREE, 1992).

Tal organização também teve posições e análises ao nosso ver mais adequadas diante dos eventos do período 1989-91, uma vez que denunciou os riscos contrarrevolucionários dos grupos sociais e movimentos nacionalistas devido às suas lideranças e programas, tendo defendido a necessidade de um partido trotskista disputar suas bases para um programa de defesa do Estado operário e de revolução política. Ademais, reconheceu o triunfo da contrarrevolução na URSS quando da vitória do contragolpe de Ieltsin, na RDA quando da queda do Muro e colapso do SED e na Polônia com a chegada do Solidariedade ao poder (EASTERN, 1990; DEFEND, 1992).

Portanto, a nosso ver, a IBT manteve maior coerência em face aos eventos de 1980-91 no bloco soviético, tendo desenvolvido análises e posições muito semelhantes às que contrapusemos aos demais grupos trotskistas ao longo desta tese.

Infelizmente não nos foi possível, por razão de tempo, analisar esses dois grupos de forma pormenorizada na Parte IV, mas acreditamos ser importante deixarmos claro que suas análises e posições serviram, ao menos em parte, de inspiração e referência para nossa própria análise. Esperamos, num futuro próximo, poder complementar esse trabalho com uma análise mais detalhada de suas contribuições à teoria do Estado operário burocratizado.

Considerações finais

Com esse trabalho, esperamos ter contribuído em alguma medida para o resgate crítico da teoria do Estado operário burocratizado, que acreditamos ter não só relevância para a compreensão da história do bloco soviético, como também ter mantido vitalidade para explicar outras formações sociais fruto de revoluções ocorridas no século passado e das contradições e desafios que elas enfrentam, quais sejam, Cuba, Coreia do Norte, Laos, Vietnã e China.

Esperamos, também, ter contribuído para um balanço crítico da história do trotskismo, que permita seu resgate e necessária atualização para os desafios do século XXI, pois acreditamos que tal vertente do movimento socialista foi a forma mais coerente assumida pelo marxismo a partir da degeneração da experiência soviética, em que pese não ter conseguido romper o isolamento na maior parte dos países em que atuou.

Somente com o resgate crítico do que o marxismo produziu de melhor no século XX é que poderemos avançar para outra forma de sociabilidade no século XXI, que não o capitalismo e a barbarização da vida que ele apresenta como único futuro possível e que já se concretiza cada vez mais em nosso presente.

Referências:

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[1] Doutor em História Social pelo PPGH UFF e professor de História na Rede Municipal de Niterói (RJ). Pesquisador da história do movimento trotskista internacional e da história das revoluções sociais do século XX, em particular da Revolução Soviética e da história da URSS. É um dos membros do Comitê Organizador Mário Pedrosa, responsável pelos Eventos Online Trótski em Permanência (2020 e 2021) e pelo II Encontro Internacional Leon Trótski (2023). O presente texto é fruto de pesquisa de doutorado parcialmente desenvolvida com recursos do CNPq. Contato: marciolmonteiro@gmail.com

[2] Essa forma “original” da teoria se faz presente em diversos documentos da Oposição de Esquerda Internacional e da Quarta Internacional. Para uma síntese a partir das palavras do próprio Leon Trotski, ver Trotsky (2009) e também os materiais presentes em Trotsky (2011).

[3] Outro elemento a nosso ver fundamental é o impacto dos processos revolucionários do pós-guerra sobre os trotskistas e as releituras por eles realizadas acerca da estratégia revolucionária originalmente delineada pela Quarta Internacional, em particular a questão da “revolução permanente”. Sobre isso, desenvolvemos uma dissertação de mestrado que aborda os debates travados no seio do movimento trotskista internacional no período 1944-63 – ver Monteiro (2016a) e, para uma síntese das conclusões principais, ver Monteiro (2016b).

[4] Ademais, a própria abordagem do arcabouço original desenvolvido por Trotski costuma ser deficitária, ao não atentar para as mudanças pelas quais ele passou até atingir o que podemos chamar de uma forma madura, na segunda metade dos anos 1930. Para uma análise desse desenvolvimento da forma “original” da teoria ao longo dos anos 1923-40, ver Romão e Monteiro (2020).

[5] Pretendemos abordar essa bibliografia, suas contribuições e seus problemas em uma publicação futura. Destacamos, não obstante, duas das raras obras que apresentam uma análise da teoria do Estado operário burocratizado que leva em conta suas apropriações por grupos trotskistas: a tese de doutorado de Mordecai Bubis (1985) e o livro de Marcel van der Linden (2007). Contudo, o estudo de Bubis é limitado aos grupos trotsksitas dos EUA dos anos 1937-51 e o livro de Linden é superficial devido a seu caráter enciclopédico (ele aborda diferentes teorias de base marxista sobre a URSS e seu desenvolvimento ao longo do século XX, sem se aprofudar em nenhuma delas).

[6] Ver Monteiro (2021).

[7] Trabalhamos, mais especificamente, com textos e documentos públicos produzidos pelos grupos internacionais selecionados para a pesquisa, publicados à época dos eventos. Tais materiais foram obtidos através do escrutínio dos principais periódicos publicados por tais grupos, através de seus órgãos internacionais de direção. Também fizemos uso complementar de documentos internos e materiais publicados pelos periódicos das principais seções nacionais desses grupos quando não encontramos dados suficientes em seus periódicos internacionais.

[8] Esse balanço pretendemos desenvolver em uma publicação futura.

[9] Cabe mencionar que o SWP dos EUA, então no interior da QI (SU), apresentou uma linha muito mais clara e direta que a direção majoritária da organização: a de acumular reformas graduais e mudar o PC por dentro para alterar o regime burocrático. Ademais, para o SWP, o Solidariedade era uma liderança adequada para o que via enquanto uma revolução política em curso na Polônia. Ver FRANKEL, 1981 e HARSCH, 1981.