Traduzimos este importante informe publicado por Comunistas Cuba, em defesa da greve dos trabalhadores ferroviários do dia 9 de maio de 2023. Ao nosso ver, Comunistas Cuba levanta corretamente a necessidade de combate à burocracia governante e contra a tentativa da direita contrarrevolucionária de ganhar espaço em nome dos recentes movimentos de insatisfação popular. Contudo, incluímos ao final uma nota explicativa sobre um aspecto do texto com o qual temos divergência.
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Em 9 de maio ocorreu uma greve de ferroviários cubanos, que exigiam o pagamento de seus salários, atrasados há mais de dois meses. Os trabalhadores paralisaram por um dia o trem que liga a cidade de Artemisa a Havana.
Não tem sido publicada quase nenhuma informação além da versão oficial distorcida publicada pelo regime em redes sociais, que caracteriza o atraso nos trens como uma “negligência”, sem sequer usar o termo greve, e aquela veiculada na imprensa de oposição, majoritariamente de direita.
É ofensivo que o governo cubano, liderado por um partido nominalmente comunista, desqualifique a luta de seus trabalhadores e não tenha uma atitude de diálogo com eles. Pelo contrário, de acordo com uma nota publicada no Facebook do governo da província de Artemisa, os grevistas receberão “medidas disciplinares para que eventos como esses não se repitam”. Esta é a reação repressiva típica de um governo que tenta restaurar o capitalismo. Mesmo que não tenha se tornado pública, a reação da burocracia sindical com certeza será de apoio à repressão administrativa. A classe trabalhadora cubana vive uma situação trágica, pois, além de sofrer a maior crise econômica desde a década de 1990, recebe os impactos do processo de transição ao capitalismo.
Nós de Comunistas Cuba exigimos que o governo não faça nenhuma represália contra os trabalhadores em greve, que pague seus salários atrasados e que lhes conceda um aumento de salário de acordo com a inflação. Exigimos também o direito de greve e autodeterminação dos sindicatos. Conclamamos as organizações marxistas em nível internacional a se unirem a essas demandas, exigindo por todos os meios possíveis – seja pela imprensa, parlamentos ou atos políticos – que nenhuma represália seja tomada contra esses grevistas cubanos.
As greves em Cuba são um acontecimento muito esporádico e têm sido combatidas pelo governo desde o triunfo da Revolução. As poucas greves que ocorreram desde 1959 até hoje foram reprimidas com demissões, desqualificadas como contrarrevolucionárias e invisibilizadas pela imprensa oficial. Com a massificação da internet e o uso generalizado das redes sociais, a burocracia dirigente é cada vez mais ridicularizada ao tentar silenciar as lutas dos trabalhadores.
Aproveitamos esta declaração para exigir a libertação dos manifestantes detidos após o protesto ocorrido em Caimanera no dia 6 de maio. Menos de uma semana após o ato da burocracia sindical para o 1º de maio, já aconteceram dois protestos da classe trabalhadora cubana!
Rechaçamos também a hipocrisia da mídia de direita, assim como de figuras contrarrevolucionárias, que se solidarizaram com os grevistas. Se a direita chegar ao poder, a classe trabalhadora sofrerá cortes, demissões e repressão piores. Nenhum governo burguês hesita em suprimir a luta da classe trabalhadora.
Nem burocracia neocapitalista, nem contrarrevolução pró-imperialista!
Lutar! Vencer! Trabalhadores ao poder!
Ao comunismo!
Comitê Editorial de Comunistas Cuba
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Nós do Reagrupamento Revolucionário discordamos da caracterização que aparecem nesse e em alguns outros textos de Comunistas Cuba, da burocracia cubana como “neocapitalista”. Discordamos não por qualquer simpatia por Díaz-Canel ou pela burocracia, mas porque caracterizamos Cuba como um Estado operário burocraticamente deformado. Isso significa que é um país governado por uma burocracia parasitária que oscila entre a pressão dos trabalhadores e as pressões do imperialismo, mas nunca poderá representar os interesses efetivos do proletariado. Hoje, a degeneração avançou ao ponto em que tal burocracia fala abertamente em restaurar variados aspectos da propriedade privada e relações de mercado, acreditando que isso pode ocorrer num cenário de “paz social” e trazer prosperidade. Isso será, porém, a cova das conquistas da Revolução Cubana, pois abre ainda maiores brechas contrarrevolucionárias na sociedade. Porém, no conjunto, tal burocracia não é ainda, sem a vitória da contrarrevolução, um organismo capitalista / burguês. É um corpo heterogêneo, onde habitam os mais variados interesses de classe, o que a torna, em última instância, mortal para um Estado operário. Mas ela não é, em sentido imediato, o mesmo que a burguesia ou que a direita pro-imperialista. É preciso, portanto, diferenciar o conteúdo de classe dessas duas forças sociais, ainda que preservando integralmente a independência de classe dos trabalhadores contra ambas.
Para ler mais de nossa posição sobre Cuba:
As manifestações em Cuba e os diversos riscos de uma restauração capitalista